Gestão

Lições de liderança de uma sobrevivente do tsunami de 2004

Deborah Telesio, CEO da Teva Empresarial

Monica Miglio Pedrosa

“O que mudou no seu jeito de liderar depois do seu último ‘tsunami’ pessoal?”. A pergunta de Deborah Telesio, CEO da Teva Empresarial, abriu a palestra de encerramento do RH Experience e deu início ao depoimento mais emocionante e reflexivo do evento.

Com voz serena e olhar firme, Deborah relembrou o dia em que esteve no epicentro do tsunami de 2004, que atingiu 14 países do Oceano Índico e matou mais de 220 mil pessoas. Ela e a amiga, Marie, estavam na ilha de Railay, no sul da Tailândia, no dia 26 de dezembro, no que prometia ser apenas mais uma das muitas viagens internacionais que faziam juntas. Pela primeira vez, decidiram fazer programas diferentes naquele dia: enquanto Marie ficou na praia, Deborah resolveu entrar em um pequeno barco e fazer duas horas de snorkeling.

Na noite anterior, ela havia acordado na madrugada sentindo um leve tremor, uma sensação familiar, já que havia morado no Chile e estava “treinada” para esse tipo de ocorrência. Mas, ao entrar no mar calmo e sem ondas da praia de Railay, um terremoto seguido de um tsunami era a última coisa que poderia imaginar.

As três ondas

Quando estava no mar, Deborah enfrentou três ondas. “Não tenho nenhuma memória da primeira delas, só um apagão”, contou. Quando conseguiu emergir e colocar a cabeça fora d’água após o primeiro impacto, já não tinha mais o snorkel. A segunda onda se ergueu como uma parede de água, e ela acreditou que aquele seria o fim, mas conseguiu passar por cima dela. “Eu não queria morrer, de jeito nenhum.”

A terceira onda veio “quebrando”, e não havia muito o que pudesse ser feito. Ela foi engolida pelo mar, tudo ficou escuro e agitado, os pensamentos se tornaram caóticos. “Era a morte. Mas aconteceu uma coisa mágica. Como se alguém estivesse puxando meus cabelos, e eu saí da água”, relembrou. Um pequeno barco a resgatou, junto a outras pessoas, todas ainda atônitas e confusas com o que havia acabado de acontecer. “Naquele momento, a única coisa que me movia era encontrar minha amiga, saber que ela estava bem.”

Deborah Telesio, CEO da Teva Empresarial
Deborah Telesio, CEO da Teva Empresarial, na palestra de encerramento do RH Experience

Ela se perguntou como faria isso em meio ao caos e à destruição. Foi então que se lembrou de uma frase da avó, sobrevivente do Holocausto. “Tudo que você sabe, ninguém tira de você”. Deborah disse que essa lembrança lhe deu a força e o protagonismo necessários para buscar Marie e honrar o fato de estar viva. “Eu tinha meus próprios recursos, que havia aprendido com a vida.”

Ao chegar ao continente, em Krabi, ela teve a dimensão do impacto do tsunami. Em meio aos destroços, uma família a acolheu, colocou-a em seu carro, levou-a para tomar um banho, deu-lhe uma toalha e a roupa do filho para vestir. Como Deborah estava descalça, o filho da mulher que a acolheu lhe ofereceu o próprio chinelo. Depois, aquela mulher a conduziu para o Centro de Informação Turística onde conseguiu ligar para a família e avisar que estava viva.

Deborah ainda caminhou por dois dias tentando localizar Marie. Uma imagem ficou gravada em suas recordações desses dias: a sacolinha de pão que recebera da família que a ajudou e que ela não conseguia largar, com medo de não ter mais o que comer.

Marie também sobreviveu, agarrando-se a uma árvore na praia quando o mar secou antes da chegada das ondas. O reencontro das duas representou um novo começo.

As dores do retorno e os aprendizados

Quando voltou ao Brasil, Deborah passou três meses em estado de graça. “Os problemas e conflitos se tornaram irrelevantes, afinal, eu havia sobrevivido.” Mas, depois da euforia, veio a depressão. Ela precisou lidar com o transtorno de estresse pós-traumático e buscar ajuda por meio de remédios e psicoterapia.

Sobreviver ao tsunami, contou, transformou sua forma de liderar pessoas. “Meu superpoder pós-tsunami foi me dar conta de que eu podia ser eu mesma, que não precisava me encaixar tanto”, disse. A partir desse reconhecimento, compreendeu que ser autêntica abria espaço para enxergar o outro e estar genuinamente presente. “Quando o líder se humaniza, cria vínculos e constrói relacionamentos que tornam possível ser feliz também no trabalho.”

Esse novo jeito de liderar, segundo Deborah, passa pela palavra amor. “Liderar pessoas é uma tremenda responsabilidade. É o famoso make it or break it”, afirmou. Influenciar vidas no trabalho vai muito além do crachá, exige lidar com conflitos, harmonizar times e ter empatia. “O amor entra no sentido de inteireza, de estar inteiro para poder liderar bem.”

Para concluir, Deborah contou que, todo 26 de dezembro, ela, Marie e suas famílias celebram juntas o que chamam de segundo aniversário, uma data de renascimento. “Como vocês podem notar, tenho 21 anos. O mar me ensinou a liderar com coragem, com presença, com aprendizado e com amor. Os tsunamis vão acontecer na nossa vida, mas o importante é definir como vamos passar por eles.”

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