ESG

“A gente se conforta na homogeneidade, mas só aprende na diversidade”, diz Grazi Mendes, Diretora de DE&I da Thoughtworks

Grazi Mendes, Diretora Latam de DE&I da Thoughtworks Foto Marcos Mesquita

Monica Miglio Pedrosa

“Estamos em um território [Bahia] que nos desafia. Aqui é terra de gente que nos conta que não existe só uma única história, uma única perspectiva. A história do mundo não é só sobre um determinado grupo”. As palavras iniciais de Grazi Mendes, Diretora Latam de Diversidade, Equidade e Inclusão na Thoughtworks, expressam a linha mestra de sua palestra: só há aprendizado na heterogeneidade, quando ampliamos nossa escuta e “desenvolvemos a curiosidade a partir de uma perspectiva que não é a sua e que te desloca”. Diversidade, inclusão e construção de um novo futuro foram os destaques da palestra de encerramento do Fórum CEO Brasil, evento do Experience Club que reúne 270 líderes empresariais e acompanhantes no Tivoli Ecoresort Praia do Forte, na Bahia.

Nascida em Minas e filha de empregada doméstica, desde muito nova Grazi se refugiava nos livros para fugir de uma realidade dura e para exercitar a imaginação como uma possibilidade de criar outros caminhos para seu futuro. Sua primeira experiência de liderança foi aos nove anos, quando criou um clube de leitura na escola pública em que estudava para justificar a compra de novos livros para a biblioteca da escola, que tinha poucos títulos. “A forma como imaginamos o futuro muda nossas ações no presente”, disse. O futuro imaginado por ela a tornou uma liderança inspiradora em tecnologia, diversidade e inclusão e a levou a ser escolhida, em abril deste ano, uma das Top 100 Futuristas e Inovadoras Globais Afrodescendentes pela MIPAD (Most Influential People of African Descent).

Ser professora é o “título mais bonito” que tem. “A educação transforma”, diz. Por isso, além de dar aulas no MBA da Fundação Dom Cabral, também é professora do cursinho preparatório para o vestibular do Morro do Papagaio, em BH. Lá ela ajuda a inspirar jovens da periferia a construir outros possíveis futuros e conhece todos os dias mentes brilhantes que estão sendo “desperdiçadas por muitas empresas”. “Essas pessoas ficam pelo caminho, não porque não têm mérito, ou porque não são boas o suficiente, mas porque a elas não é dada a oportunidade. São muitas as barreiras de uma pessoa que vem da realidade periférica para chegar e se manter no mundo corporativo”, contou.

Grazi usou uma história pessoal para exemplificar essas barreiras. Ela recebeu seu primeiro feedback da carreira como estagiária em uma multinacional: precisava melhorar seu networking. Os outros colegas se conheciam havia muito tempo, tinham todos estudado na mesma escola de elite e frequentavam o mesmo clube. “Esse era um capital social a que eu não tinha acesso”, disse. O tíquete alimentação que ela recebia não podia ser usado para almoçar com os colegas, como a pessoa de RH sugeria, pois era usado para a compra de alimentos para casa. Pouco tempo depois, na mesma empresa, ela ganhou um prêmio por sua proatividade. Ela havia automatizado um processo de um colaborador, agilizando seu trabalho, enquanto conversava com ele e entendia sua dificuldade. “O que a empresa chamava de proatividade eu chamava de ‘se viração’ e essa não é uma competência avaliada formalmente por RH.”

Para Grazi, a falta da diversidade nas organizações tem causado muitas distorções em produtos que são entregues no mercado, como um dispenser que só reconhece a mão de pessoas brancas para liberar sabão. “Que outros ‘dispensers’ temos no dia a dia das nossas empresas que não percebemos? Por que os programas de liderança usam apenas referências do norte global? Como falar de inovação em um país quando não conhecemos as inovações locais?”, foram algumas das perguntas que ela fez à plateia.

Ela defende maior diversidade de gênero e raça em tecnologia, para eliminar vieses na codificação. “Se investimos demais na humanização das máquinas e menos na conscientização das pessoas, elas passam a ser recursos nas empresas. O meio ambiente vira recurso que a gente pode consumir. Agora estamos lidando com o impacto destas escolhas do passado”, disse.

Qual a mudança que sua caneta alcança?

Apesar de grandes mudanças dependerem da união de muitas pessoas, Grazi diz que sempre é possível fazer algo que esteja ao ‘alcance da sua caneta’. Ela pediu a todos para refletir sobre o que fazemos com cada pessoa que cruza o nosso caminho. “O que você toca precisa ficar melhor depois que você passa.”

Grazi acredita que as empresas têm muito a ganhar com times heterogêneos e diversos. Ela diz que as pessoas se confortam na homogeneidade, mas só aprendem na diversidade. “Ao optar pela homogeneidade vamos perdendo a noção de vida e achando que ela é uma ilusão compartilhada que eu tenho no mesmo grupo. Isso não ajuda a aprender”. Para finalizar, Grazi convocou os executivos a refletirem sobre seu legado. “Herança é aquilo que deixamos para nossos filhos, legado é o que deixamos para o mundo.”

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