“Como o ipê, florescemos nos momentos mais desafiadores”, afirma Waldir Beira Jr, presidente da Ypê

Monica Miglio Pedrosa
Crescer e desenvolver resiliência nos momentos de adversidade sempre foi a marca da Ypê e também da família Beira, que a fundou. Assim como o ipê, árvore que floresce justamente na seca, a empresa encontrou nos momentos mais difíceis a força para se reinventar, inovar e seguir adiante. Waldir Beira Junior, hoje presidente da Ypê, começou a se envolver nos negócios em um desses períodos desafiadores, quando seu pai havia investido em uma máquina importada para modernizar a produção, mas enfrentava dificuldades em fazê-la funcionar.
A proximidade entre vida familiar e empresa marcou a infância de Waldir. No início do negócio, a fábrica era quase uma extensão da casa. Foi nesse ambiente que ele acompanhou de perto a dedicação do pai ao trabalho e à busca pela qualidade do produto entregue no mercado. Essa qualidade, aliás, foi o que sustentou a empresa em momentos críticos, como na década de 1980, quando o Plano Sarney congelou os preços dos produtos para combater a hiperinflação. Um erro na tabela oficial do governo incluiu a marca Ypê ao item “sabão em barra”, congelando o preço apenas deste produto.
Waldir contou que seu pai transformou o problema em oportunidade. Enquanto negociava com o governo a correção do erro, aproveitou para ampliar a base de consumidores, mesmo com margens reduzidas. Desde essa época, a embalagem já trazia o texto “Nossa melhor propaganda é a qualidade” e foi nesse diferencial que a empresa apostou.
Mas não foi apenas o lado profissional o foco da palestra de Waldir durante o Fórum CEO Brasil 2025. O executivo compartilhou histórias pessoais muito difíceis, que, como na empresa, forjaram sua maturidade e a calma com que relatou no palco até os acontecimentos mais duros.
“A calma comunica”
O primeiro grande baque foi o falecimento do pai, vítima da queda de um guincho em uma obra dentro da própria fábrica. Diante da tragédia, Waldir precisou se reerguer rapidamente e, já na manhã da segunda-feira seguinte, reuniu todos os colaboradores para anunciar que a empresa iria continuar e que todos os empregos estavam garantidos. A partir dali ele, os dois irmãos e a mãe, atuando no Conselho, levaram o negócio adiante. Toda vez que surgia um impasse, recorriam à pergunta: o que o pai faria nesse momento? “Invariavelmente obtínhamos a resposta e sabíamos o que fazer”, contou.

Outro golpe atingiu a família quando Waldir e a mãe foram abordados por três homens armados ao sair de uma instituição filantrópica que acolhe crianças, da qual ela era presidente. Os dois foram obrigados a entrar no carro e, após ameaças, Waldir foi abandonado em um canavial, enquanto a mãe era levada pelos sequestradores. Durante a negociação, a postura calma e a fala baixa de Waldir fez toda a diferença. “A calma comunica”, disse.
Depois desse episódio, a família optou pela privacidade para preservar a liberdade. Em 2002, uma nova provação atingiu o núcleo familiar de Waldir. Seu filho mais novo, Francesco, então com um ano e cinco meses, começou a apresentar dificuldades para andar em linha reta. Os exames revelaram um grande tumor cerebral. Os primeiros médicos disseram que era inoperável, até que a família chegou ao neurocirurgião Evandro de Oliveira, referência mundial na área que aceitou realizar a cirurgia.
Reuniões nos corredores do hospital
Foram 14 horas de espera de Waldir e de sua esposa, Priscila, no hospital. Quando o médico finalmente trouxe notícias, toda apreensão sumiu: a intervenção havia sido um sucesso. Infelizmente, algum tempo depois o câncer retornou, dessa vez de forma inoperável. A partir daí, seguiram-se quase nove anos de cuidados, com sessões de quimioterapia, novas cirurgias e longas internações hospitalares. “Fazia reuniões de negócio nos corredores do hospital”, contou Waldir.
Quando a medicina já não tinha mais recursos, a família optou por montar uma UTI em casa, para garantir ao menino o conforto do lar. Em seus momentos finais, Priscila estava novamente grávida, dessa vez de uma menina, como a primogênita. Dois meses após a partida de Francesco, nasceu Ana Francesca, em homenagem ao irmão, simbolizando a continuidade da vida.
A liderança de Waldir à frente da empresa manteve o legado de qualidade herdado do pai e levou a Ypê a estar em 95,6% dos lares brasileiros, alcançando a liderança em quatro categorias: detergente líquido, sabão em barra, amaciante de roupas e lava-roupas em pó. “Nunca pensamos em trabalhar para sermos líderes, ou para alcançar essa posição. Ela foi apenas consequência de um trabalho bem-feito”, afirmou. Em 2007, a Ypê firmou parceria com a SOS Mata Atlântica e iniciou um amplo programa de reflorestamento, que já ultrapassa 1,2 milhão de árvores plantadas em áreas devastadas.
“Hoje vejo que nossa história reflete muito aquilo que vemos na árvore ipê, que floresce em tempos de seca. Nossa empresa floresceu nos momentos de maior estresse. Nós nos transformamos em pessoas melhores do que éramos antes, depois de todo o estresse pelo qual passamos”, concluiu.

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