O escritório precisa ser acolhedor para as pessoas voltarem, diz Sergio Athié, da Athié Wohnrath
Por Denize Bacoccina
O arquiteto Sergio Athié, sócio-fundador da Athié Wohnrath, junto com Ivo Wohnrath, é um especialista em espaços de trabalho. Com mais de 2 mil projetos realizados e 72 em andamento, a empresa tem mais de 900 funcionários, entre eles mais de 200 arquitetos, e faz de interiores de escritórios, fábricas, escolas, edifícios residenciais e corporativos a retrofits. Com toda essa experiência, Sergio Athié conta, nesta entrevista à [EXP], como as empresas podem convencer seus profissionais a voltar ao trabalho presencial. “É preciso criar um ambiente que seja acolhedor. Ninguém quer sair de casa e chegar num lugar todo cinza”, diz Sergio.
A própria sede da Athié Wohnrath, num prédio moderno no Brooklin, é uma espécie de portfólio da empresa, com espaços cenográficos com bancos e poltronas confortáveis, auditório, salas de reunião com tecnologia embarcada para facilitar a participação remota, espaços de silêncio, copa ampliada para estimular as refeições no local e um mobiliário moderno e sofisticado. É assim, oferecendo espaços de bem-estar, que as empresas vão atrair os profissionais de volta para o trabalho presencial. Que, na visão dele, é essencial para os trabalhos de criação em equipe.
Os novos locais de trabalho têm vários ambientes, numa mistura de espaços compartilhados com salas individuais. Só que, agora, não é o status profissional que determina o local que cada um vai ocupar, se uma sala coletiva ou individual, mas a tarefa que precisa realizar. Ao longo do dia, a mesma pessoa pode fazer uma reunião com um grupo em uma sala e com outra equipe em outro local. Depois, pode escolher um espaço individual fechado para fazer ligações e, em outro momento, buscar um local tranquilo onde possa se concentrar pra escrever um relatório.
[EXP] – Durante a pandemia, houve um esvaziamento dos escritórios, as pessoas ficaram bastante tempo no trabalho remoto, depois foram voltando e muitas empresas perceberam que precisavam redesenhar seus espaços. Como está a demanda das empresas hoje? Houve uma mudança no tipo de projeto que elas pedem?
Sergio Athié – Houve uma mudança na dinâmica da forma de trabalhar. Muitas empresas perceberam que as pessoas poderiam colaborar remotamente. E, quando as pessoas voltam para o escritório, elas não querem só ficar sentadas numa mesa. Os layouts tiveram um aumento das áreas de colaboração, para permitir times maiores. A tecnologia também é muito importante. Tanto nas reuniões presenciais quanto nas reuniões híbridas, para incluir quem está fora. É preciso ter câmeras de vídeo para que as pessoas possam ver a linguagem corporal umas das outras. Isso virou fundamental. Também virou fundamental a tecnologia para reserva de espaço nas salas.
Vejo uma presença cada vez maior nos escritórios. Nos primeiros projetos depois da pandemia, o cliente solicitava 50% de mesas em relação ao total de colaboradores. Agora estão pedindo em torno de 70%, que é praticamente espaço para todos, se descontarmos quem está em férias ou licença.
Ambientes diversos atendem a diferentes momentos e necessidades do trabalho.
Essa volta ao presencial também tem como objetivo aumentar a socialização das equipes? O que está sendo feito para isso?
As empresas estão sentindo necessidade de conectar mais os colaboradores. Temos feito áreas de socialização bastante grandes, que fomentem o encontro de pessoas de áreas distintas. Muitas empresas contrataram na pandemia e alguns funcionários nem se conheciam.
Aqui mesmo, quando vamos discutir um projeto, preferimos reunir todo mundo na mesma sala. Remotamente é mais difícil, não gera engajamento.
O pior modelo, na minha opinião, é quando as pessoas se dividem e cada um vai num dia. As pessoas se deslocam e não se encontram.
Vocês já incluem essas tecnologias nos projetos?
Oferecemos uma solução completa. Uma tecnologia que seja amistosa, fácil de usar. O trabalho remoto também trouxe uma outra noção de pontualidade nas reuniões. As pessoas chegam no horário e terminam no horário, porque a sala vai ser ocupada por outra reunião. Isso melhorou muito a dinâmica de trabalho.
Esse tempo trabalhando em casa mudou as expectativas das pessoas em relação ao local de trabalho?
Mudou. As pessoas precisam de espaços diferentes, de acordo com o momento. E vão se deslocando durante o dia, dependendo da tarefa. Dificilmente ficam na mesa o tempo todo. Em algum momento, podem usar uma mesa tradicional. Mas em outro é uma reunião colaborativa, ou um feedback numa salinha menor, com poltronas. Também criamos espaços de quiet zone, para tarefas que demandem foco, onde a regra é fazer silêncio para não atrapalhar os colegas. Nós criamos os espaços e medimos o que deu certo, quais espaços foram mais frequentados, e vamos adaptando.
Como os projetos podem trazer mais bem-estar aos funcionários?
O conceito de bem-estar está muito presente, e inclui um ambiente de socialização bacana, elementos naturais, de biofilia, como plantas, além de outras coisas mais técnicas, como o sistema de renovação de ar, ou o tipo de amenidades que a empresa vai proporcionar. Tudo entra como fator de atração dos colaboradores. Um espaço de massagem, de ioga, de manicure. E uma coisa que ficou ainda mais importante é conectar as pessoas com a atividade da empresa. Um escritório que realmente reflita o DNA daquela companhia, tenha produtos feito por ela, promova uma imersão. Para isso, nós trabalhamos junto com o pessoal de branding, seja nosso ou da própria empresa.
Isso é para marcar a diferença entre trabalhar na empresa e trabalhar em casa?
Pelas pesquisas, acho que as pessoas se cansaram um pouco de trabalhar em casa, acordar e passar o dia no mesmo lugar. A neuroarquitetura nos ensina que a vivência do espaço gera um pertencimento maior, uma memória maior, por causa da associação do que foi dito com o espaço.
Outra tendência são os espaços de alimentação. Temos em quase todos os projetos. Os estúdios de TV, que não eram um elemento tão solicitado, passaram a ser muito usados. Hoje, 90% dos projetos têm estúdio. Na XP fizemos quase um andar inteiro de estúdios.
Muitas reuniões também passaram a ser online, o que demanda espaços adequados, com tecnologia específica para esses encontros. É muito mais barato equipar uma sala do que pagar passagens para o time inteiro se deslocar e se reunir presencialmente.
Espaços de compartilhamento e interação.
E existe uma preocupação maior com acessibilidade?
Sim, mas não é de agora. Já era uma tendência as empresas terem diversidade nos quadros e prepararem o espaço para isso, com mobiliário acessível. Em algumas empresas, temos feito também alguns banheiros sem gênero.
As pesquisas estão mostrando que as empresas desejam mais o trabalho presencial do que os colaboradores, que querem mais flexibilidade. Como lidar com isso?
Tem dados mostrando que o Brasil é o país com maior trabalho presencial. Muitas empresas estão percebendo que o trabalho presencial é importante em alguns casos. Algumas devolveram espaço de escritório e se arrependeram.
Tem que ter um equilíbrio. Não sou a favor de 100% presencial, mas eu também acho que 100% remoto, dependendo da atividade, também não funciona.
O que as empresas precisam fazer para trazer as pessoas de volta?
Tem que fazer ambientes sedutores, com grandes áreas de encontro. Espaços de café enormes, onde a pessoa se sente como se fosse encontrar os amigos, eventualmente vai poder fazer uma massagem no meio da jornada. É criar um ambiente que seja acolhedor. Ninguém quer sair de casa e chegar num lugar todo cinza.
Durante a pandemia falou-se sobre o fim da Faria Lima e o impacto do trabalho remoto nessas regiões que são exclusivamente corporativas. A Faria Lima não acabou, é claro, mas como você vê a influência desses espaços corporativos na cidade?
Hoje a Faria Lima tem uma vacância baixíssima. É uma referência. E por que as pessoas querem estar lá? Porque é um hub do mercado financeiro, um ecossistema que funciona muito bem, de empresas que têm atividades afins.
Os escritórios têm um impacto muito grande nas cidades. É ruim fazer um escritório num lugar onde não tenha nada, porque aí é preciso trazer tudo para dentro da empresa.
Mas também novas regiões podem ser criadas a partir de um grupo de empreendimentos. É o que está acontecendo atualmente na Chácara Santo Antônio, com avenidas novas, uma urbanização completa, com passarelas ligando os prédios. Prédios residenciais, shoppings, serviços, tudo conectado.
Que outras tendências têm surgido nas cidades?
Eu sou muito a favor da integração dos prédios com a cidade. Acho que eles devem ser abertos, como a baleia na Faria Lima. A segurança é feita pelas pessoas. Hoje, a maioria dos empreendimentos são abertos, sem grades, com parques e praças que são para a cidade. Essa é a tendência.
Outra tendência são os empreendimentos mistos: lojas do térreo, escritórios numa parte e apartamentos em outra. Apartamentos até de alto padrão estão sendo feitos assim. Em Nova York, por exemplo, os prédios mais chiques têm estabelecimentos comerciais, loja, hotel. Isso está mudando um pouco aqui, está se quebrando um paradigma. Isso melhora a cidade como um todo, as pessoas poderem fruir, aproveitar todos os serviços sem ter que pegar carro. Eu sou a favor do adensamento. As grandes cidades são concentradas. Você consegue ter melhores serviços em uma área menor.
Sala de reuniões da Athié Wohnrath com recursos tecnológicos.
Quais são os principais projetos da Athié para esse ano?
Estamos com um volume bem grande de projetos, muitos de empresas que estão querendo fazer essa mudança dos interiores. Muitas já fizeram. A PwC é um exemplo: estava na Água Branca, numa área verticalizada, e mudou para a Faria Lima, numa área menor. É mais central, mais próximo dos clientes e ficou incrível.
Outra coisa que temos feito bastante são espaços de eventos que não sejam usados só pela empresa, mas cedidos para parceiros. Aqui mesmo, nós cedemos nosso auditório para ONGs ou associações. E com isso vêm pessoas de fora e passam a conhecer o nosso trabalho.
Também estamos fazendo imóveis comerciais. Temos um braço de incorporação que está indo muito bem, com empreendimentos só nossos ou em parceria com outras empresas. Também temos atuado no segmento de educação, fizemos várias escolas bacanas. Para cada segmento, temos uma construtora com perfil diferente.
Este ano, temos como objetivo sedimentar essa base que construímos. O mercado está aquecido, apesar das dificuldades deste começo de ano, com novo governo, taxa de juros, guerra da Ucrânia, importações da China que ainda não se normalizaram, conjuntura internacional que não está boa. Tem uma série de desafios no mundo inteiro, mas sempre fomos otimistas. A gente gosta de olhar pra frente, de sermos criativos, antenados. Sempre atrás das tendências para atender nossos clientes, em todos os segmentos em que atuamos.
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