Histórias da Vida

O novo capítulo da jornada de Cris Palmaka

Cristina Palmaka

Monica Miglio Pedrosa

Após dedicar 40 anos ao mercado corporativo e construir uma carreira de sucesso em empresas de TI, Cris Palmaka deixa a presidência da SAP América Latina e Caribe (LAC) no fim de março e inicia um novo capítulo em sua jornada. Nessa nova etapa, além de seguir como membro do conselho de administração de grandes empresas, ela pretende atuar como mentora de startups e dedicar mais tempo aos projetos pessoais e à família.

Entre eles estão duas paixões, a participação em maratonas – após completar as 7 provas do Abbot World Marathon Majors, ela se prepara para repetir a maratona de Paris, em abril – e a busca constante por conhecimento. Atualmente, Cris cursa uma pós-graduação em filosofia e propósito de vida pela PUC-PR e PUC-Campinas, temas que também a aproximam da filha, graduanda em Psicologia.

Reconhecida como uma das mais importantes líderes do setor de TI, Cris Palmaka foi apontada pela revista Forbes como uma das principais CEOs do Brasil e está entre as 500 pessoas mais influentes da América Latina, segundo a Bloomberg Linea. Também integra a HITEC 50 de 2022, que destaca os 50 líderes mais relevantes do setor de tecnologia na AL, Espanha e Portugal. Durante sua carreira, a executiva liderou a SAP Brasil por sete anos (2013-2020), além de ter passado por cargos executivos na Microsoft, HP e Philips. Atualmente, ela é membro dos conselhos de administração da C&A e da Arcos Dourados (McDonald’s) e do conselho consultivo da Eurofarma.

Nesta entrevista exclusiva à [EXP], Cristina Palmaka compartilha histórias de sua trajetória pessoal e profissional, refletindo sobre temas como liderança feminina, equilíbrio entre vida pessoal e carreira, o impacto transformador da tecnologia e a paixão por pessoas.

Cris Palmaka
Cris Palmaka adora sentir a adrenalina das corridas e a tranquilidade mental que vem após o treino

Uma contadora em TI

“Meus pais trabalharam em banco, se dedicaram à área financeira. Um dos meus irmãos também seguiu a mesma área. Minha formação foi em administração, com foco em contabilidade. Naquela época, eu e meu irmão fazíamos uma renda adicional preenchendo manualmente o Imposto de Renda, meu sonho era montar um escritório para dominar esse mercado! Percebi que sou boa com números, sou super analítica, mas gosto mesmo é de lidar com pessoas. Acabei indo trabalhar com produto, nas áreas de marketing e comercial, que me permitiam criar essa conexão com as pessoas, conquistar sua confiança.”

Múltiplos aprendizados

“Na Philips, iniciei na área de produto, depois segui para planejamento estratégico, em seguida compras internacionais, uma área completamente nova, na época em que o governo Collor reduziu impostos e abriu o país para a importação de produtos. Essa é uma característica minha, abraçar coisas mesmo que não as conheça tão bem. Depois segui para marketing e vendas. Quando concluí meu MBA, em 1999, minha tese foi sobre o impacto da Internet nas vendas de varejistas tradicionais. Ali, comecei a direcionar meu olhar para tecnologia.”

Despertar para TI em Austin

“Fui terminar meu MBA em Austin [Texas, EUA] e ali era a sede da Dell. Muitos professores do mestrado trabalhavam lá. A empresa estava começando, na época, a vender PCs de forma direta, por call center. Foi então que meu interesse por tecnologia despertou de vez. Um colega havia ido para a Compaq, cuja sede era em Houston, e fui trabalhar na empresa no Brasil. Me deparei com um mercado que tinha uma velocidade muito diferente da que eu estava acostumada, trabalhando até então em uma empresa europeia [Philips].”

Cris Palmaka realizou as 7 principais provas do Abbot World Marathon Majors

Compaq e HP: a grande virada

“A Compaq foi minha grande entrada em tecnologia, depois a empresa foi adquirida pela HP. Fiquei 10 anos na companhia, os últimos três atendendo o mercado da América Latina. A fusão com a HP foi um grande aprendizado, porque as duas empresas tinham culturas muito diferentes. A Compaq tinha muita flexibilidade, era mais dinâmica, e a HP era uma indústria bem estruturada, com sede em Palo Alto [Califórnia]. Abraçar o melhor de cada cultura para construir algo ainda melhor foi um super aprendizado. Para mim foi uma grande virada de vida, aprendi a tomar decisões rápidas e a não me prender a ideias que não deram certo, tentar novamente.”

Liderança feminina

“Meu pai sempre me dizia para eu me sustentar sozinha, não depender de ninguém. Nos primeiros anos profissionais, não prestava atenção no tema liderança feminina. Claro que me moldei, sem perceber, ao estilo corporativo de então, meu armário era todo preto, azul marinho, usava salto alto. Demorei para usar roupas coloridas no trabalho. Mas sempre fui uma pessoa de dar opinião, de participar, de ganhar meu espaço. Nunca me senti preterida ou excluída por ser mulher. Claro que era comum ter dez pessoas em uma sala de reuniões e eu ser a única mulher entre elas, mas procurava ver o lado bom disso. Na troca de cartões, tinha o Paulo, o André, o fulano, mas só eu de Cristina e isso era uma vantagem competitiva, ninguém esquecia de mim. Brincadeiras à parte, reconheço que tive a oportunidade de trabalhar em empresas diferenciadas em relação ao tema, como a SAP. Em 2013, uma líder das Américas tomou a decisão de equiparar os salários de homens e mulheres que estavam no mesmo cargo, em uma época que ninguém falava disso.”

Potencial de transformação da tecnologia  

“Há pouco mais de 10 anos, em um evento de lançamento do nosso laboratório em São Leopoldo, o Jorge Gerdau estava presente e já falava que todas as empresas iam depender tanto de tecnologia que se tornariam empresas de tecnologia. E é cada vez mais desta forma, a tecnologia está embebida em toda a estratégia de negócios, nas ofertas de produto, essa é uma evolução que não é de agora. Para além dos negócios, acredito que precisamos olhar a tecnologia para resolver temas críticos da humanidade, como os climáticos, as desigualdades. Como ajudar pessoas em situação de vulnerabilidade a não ficar cada vez mais excluídas da sociedade? Temos de ter a preocupação de olhar para isso, investir em educação, para que essas diferenças não sejam tão grandes.”

IA x humano

“O futuro, na verdade o presente já é cada vez mais sobre tecnologia. Conectada às nossas soluções, ajudando a fazer melhor o que o ser humano faz. Mas ainda defendo que é preciso ter um cérebro humano avaliando, entendendo se a lógica da máquina faz sentido, ensinando-a a a fazer seu processo. Isso ainda é essencial.”

Definição de sucesso

“Para mim, nunca foi só sobre o sucesso no trabalho, sempre tive como objetivo fazer o que gosto, gerar impacto nas indústrias em que trabalhei, mas equilibrar isso com meu lado pessoal, ter tempo para meu companheiro de vida, que está comigo há mais de 30 anos, para minha filha, meus pais. Tempo para me manter em forma, para me dedicar às corridas. Cada pessoa tem sua própria definição de sucesso e a minha é essa. Se eu precisar destruir meu casamento, minha família, pelo trabalho, isso não é sucesso pra mim. Tanto que neguei algumas oportunidades porque a decisão tem que sempre levar em consideração o que é melhor pra minha família.”

Equilíbrio profissional e pessoal

“Tive um chefe que me falou que quando usamos a imagem da balança para falar de equilíbrio entre a vida pessoal e profissional essa imagem está equivocada. De fato, não dá para colocar os mesmos pesos, na mesma proporção nos dois lados da balança. Em alguns momentos, a vida pessoal toma mais espaço que a profissional e sempre tive um time para ser o meu backup quando necessário. Em outros, o trabalho exigiu mais tempo que a vida pessoal. E essa escolha tem que ser sua.”

“Dicas de Ouro” da Cris

“Em primeiro lugar, onde você coloca energia, foco, é onde as coisas se materializam. Tenha a perspectiva do que você quer atingir, se empenhe para realizar isso. Em segundo lugar, é preciso ter coragem pra fazer as mudanças necessárias, para questionar o status quo. Se ficarmos na nossa zona de conforto, vamos continuar fazendo o que já foi feito. Na SAP, começamos a falar de saúde mental em 2018, uma discussão que foi liderada pelo CEO global. Um baita aprendizado, aprendemos a tirar os dogmas corporativos de quem fazia terapia.”

Corrida e qualidade de vida

“Sempre gostei muito de esporte. Tenho dois irmãos, então joguei muito futebol, depois fui para o vôlei, basquete. Com o trabalho, as viagens, fica difícil manter o ritmo de praticar esportes coletivos. Em 2000, comecei a fazer uma aula de corrida na academia, mas não via muito sentido no início. Meu marido também corria e aos poucos nos juntamos a um grupo, combinamos a primeira corrida, que tinha 8 km. Aos poucos fui vendo que o objetivo era superar a mim mesma. Além disso, é um esporte que dá para levar para qualquer lugar. Virou um vício, a adrenalina da corrida e a tranquilidade ao final dela. Já são 25 anos correndo e o que parece ser um esporte individual é na verdade algo coletivo, porque tem a conexão com o coach, o nutricionista, o time de apoio. É um esporte bem parecido com o que vivemos no corporativo. Há um objetivo, nos preparamos para ele, realizamos a prova. E tem a conexão com todas as pessoas que correm também. Virou ‘desculpa’ para eu e meu marido viajarmos e a próxima será para fazer a corrida em Paris, em abril.”

Com o marido e companheiro de vida há mais de 30 anos, Luiz de Luca

Mentoria de Startups

“Fiz uma apresentação para uma startup de RH há algumas semanas e gostei de interagir com uma geração tão jovem, que tem um modelo mental diferente. Acredito que eu possa contribuir com meu conhecimento, não só das empresas em que atuei, mas nas interações que tive com clientes de diferentes indústrias. Será uma boa troca.”

Mensagem que daria para a Cris do início de carreira

“Se cobre menos. Vai dar certo!”

  • Aumentar texto Aumentar
  • Diminuir texto Diminuir
  • Compartilhar Compartilhar