O que acontece no dia seguinte à criação da AGI?

Emerson Lima, CEO e fundador da Sauter*
A chegada da Inteligência Geral Artificial (AGI) — uma IA com capacidades cognitivas semelhantes ou superiores às humanas — promete revolucionar o nosso mundo. Muitas discussões sobre este marco focam-se nos potenciais distúrbios sociais: mercados de trabalho virados do avesso, desinformação a uma escala sem precedentes e a possibilidade de uma superinteligência desalinhada com os valores humanos. No entanto, alguns pesquisadores e cientistas da computação sugerem que o impacto mais profundo e imediato pode não ser social, mas sim profundamente pessoal.
A crise de identidade filosófica
Um dos maiores abalos causados pela AGI será uma crise de identidade filosófica. Durante séculos, a humanidade definiu-se através da sua inteligência, criatividade e capacidade de tomar decisões. Somos a espécie que pensa, que resolve problemas, que cria arte e que navega pelo mundo usando a nossa capacidade mental.
O que acontece quando criamos uma entidade que pode fazer tudo isso, mas melhor?
No dia em que a AGI se tornar uma realidade acessível, poderemos começar a questionar o nosso próprio valor e propósito. Se uma máquina pode escrever um romance mais cativante, compor uma sinfonia mais comovente ou conceber uma estratégia de negócios mais eficaz, o que resta que seja unicamente humano?
A externalização do pensamento
Estamos testemunhando uma transformação impensada: a externalização das nossas capacidades cognitivas para sistemas de IA. Isso já se manifesta na nossa dependência do GPS para navegação ou dos motores de busca para obter respostas. Com a AGI, este fenômeno alcançará um novo patamar.
Imagine assistentes de IA contextuais que conhecem as suas preferências, o seu histórico e os seus objetivos. Estes assistentes poderiam antecipar as suas necessidades, desde sugerir o que comer ao jantar até determinar a sua carreira profissional. Embora conveniente, esta orientação constante começa a esbarrar na linha entre o pensamento humano e a sugestão da IA.
O perigo reside numa potencial desmoralização. Se cada decisão, desde a mais trivial à mais importante, for otimizada por uma IA, poderemos perder a confiança nas nossas próprias capacidades de raciocínio. A nossa intuição, a nossa criatividade e a nossa capacidade de fazer escolhas informadas podem atrofiar por falta de uso, levando a uma dependência que diminui a nossa agência e o nosso sentido de identidade.
O dia seguinte: um desafio pessoal
Assim, o dia seguinte à criação da AGI pode não ser marcado por robôs nas ruas, mas por uma mudança silenciosa e interna. Será um dia em que cada um de nós terá de confrontar o que significa ser humano num mundo onde a inteligência já não é o nosso monopólio.
A questão central não será “O que podemos fazer com a AGI?”, mas sim “Quem somos nós na presença da IGA?”. Enfrentar este desafio exigirá uma reflexão cuidadosa sobre os nossos valores e sobre o que escolhemos preservar como o núcleo da experiência humana. A forma como navegamos nesta crise de identidade pessoal determinará se a era da AGI será uma de florescimento ou de obsolescência autoimposta.
*Emerson Sauter, CEO e fundador da Sauter Digital, tem mais de 10 anos de experiência nas áreas de negócios e tecnologia.
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