A visão da Planet Smart City para o futuro das moradias populares

Monica Miglio Pedrosa
Transformar o conceito de moradia popular foi o desafio que moveu Susanna Marchionni, CEO da Planet Smart City no Brasil, a trocar a Itália pelo Ceará. Há dez anos, ela chegou para entregar um projeto da empresa no País e pretendia permanecer inicialmente por apenas dez meses. Mas ela acabou não só não voltando mais para a Itália como conquistando a cidadania brasileira, que hoje exibe com orgulho.
A Planet Smart City é pioneira no desenvolvimento de bairros e cidades inteligentes e inclusivos, cofundada por Susanna e pelo ex-marido, Giovanni Salvio. No Brasil, a executiva direcionou seus esforços às habitações populares do programa Minha Casa, Minha Vida. “Aprendi com uma das arquitetas mais famosas de Turim, na Itália, que falava que a beleza está na alma. Cada objeto de decoração que colocamos em uma casa vai impactar o dia a dia de alguém, vai dar um carinho na alma das pessoas”, relembrou.
No palco do segundo dia do Fórum CEO Brasil 2025, Susanna revisitou os primeiros passos dessa jornada no País e a descrença que enfrentou ao anunciar a construção de uma cidade inteligente no interior do Ceará. “Eu era a ‘italiana doida’ que ainda não falava uma palavra em português e tinha que lidar com empresas de construção civil majoritariamente liderada por homens”, afirmou. Os obstáculos foram muitos, desde orçamentos que variavam de R$ 300 mil a R$ 3 milhões para o mesmo escopo de obra, até a dificuldade de levantar recursos no início do projeto. Ainda assim, seguiu adiante com a convicção de que seu projeto poderia transformar vidas.
O divisor de águas veio no Natal de 2018, quando, depois de investir todos os recursos próprios e já sem dinheiro para pagar salários no mês seguinte, Susanna conheceu o empresário italiano Stefano Buono. Físico, ele havia fundado a newcleo, startup de tecnologia nuclear adquirida pela Novartis por US$ 3,9 bilhões. Buono se encantou com a proposta da Planet Smart City e decidiu investir no projeto. Hoje é presidente do conselho da empresa e abriu portas para a entrada de outros investidores. A companhia já levantou 25 milhões de euros em três rodadas de investimento, segundo o Crunchbase.

O futuro é de projetos abertos à comunidade
De acordo com Susanna, a Planet Smart City se apoia em quatro pilares: tecnologia como meio de transformação, cuidado com o meio ambiente, urbanismo e arquitetura de qualidade, e inclusão social. Na prática, isso significa ir além das “caixinhas de frango”, nome dado por ela às casas entregues, em especial, na Faixa 1 do Minha Casa Minha Vida (para famílias com renda bruta mensal de até R$ 2.850), em que todas as unidades são idênticas e não há infraestrutura de lazer ou serviços.
Nos projetos da Planet, os moradores têm acesso gratuito a espaços compartilhados, como espaço de coworking, biblioteca, cozinha coletiva, horta urbana, viveiro, cinema comunitário e até uma sala onde é possível usar ferramentas e equipamentos emprestados. O mais importante, ressalta Susanna, é que esses serviços também são abertos à comunidade do entorno, fortalecendo os laços entre moradores e vizinhos.
Para gerir essa rede de serviços, a empresa desenvolveu o Planet App, aplicativo gratuito que funciona como um painel de controle da cidade. Nele, os moradores se conectam a eventos, grupos de interesse, serviços locais e recebem suporte de um community manager, profissional responsável por apoiar desde pequenas demandas de infraestrutura até ações que reforcem o senso de pertencimento da comunidade.
O primeiro projeto da Planet no Brasil foi a Smart City Laguna, em São Gonçalo do Amarante, no Ceará, hoje referência internacional em urbanismo inclusivo. A partir dali,a empresa expandiu sua atuação para Aquiraz, também no Ceará, para Natal (Rio Grande do Norte) e para projetos verticais em São Paulo. Em todos os casos, a lógica é a mesma: unir habitação popular a serviços comunitários e espaços coletivos que incentivam o cuidado com o bem comum.
A Planet Smart City também levou seu modelo para a Índia, onde chega a desenvolver projetos de até 10 mil unidades por vez, e para os Estados Unidos. Em Turim, mantém um centro de competência responsável por apoiar e acompanhar iniciativas em diferentes países, tanto em projetos populares quanto em empreendimentos de alto padrão.
O impacto do trabalho já vem sendo reconhecido globalmente. Em 2023, a companhia foi premiada pela ONU com US$ 1 milhão para instalar painéis fotovoltaicos nas casas da Smart City Laguna, monitorando como as famílias direcionavam os recursos economizados com energia. Para Susanna, iniciativas como esta comprovam que é possível unir inovação tecnológica, sustentabilidade e impacto social em larga escala.
Defensora de projetos abertos, a executiva acredita que o futuro das cidades passa pela integração com as comunidades. “Muitos me dizem que essa ideia não é segura. Eu respondo que os muros não vão dar segurança, mas sim o acesso à educação, à saúde, ao investimento em cultura”, afirmou. Para ela, o conceito de bem comum, aplicado de forma exemplar no norte da Europa e no Japão, deve servir de inspiração: “Todos cuidam da calçada, da praça, do jardim e do entorno da sua moradia. Esse é o verdadeiro caminho para construir cidades melhores”, concluiu.

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