A estratégia da Alelo para o mercado aberto de benefícios
Para Márcio Alencar, diretor da companhia, as mudança recentes na regulamentação do setor são bem-vindas e vão reduzir em 30% as taxas para os lojistas, mas há riscos de desvio de recursos para itens que não são de alimentação
No final de 2020, o governo anunciou uma série de mudanças no PAT (Programa de Alimentação do Trabalhador), que regulamenta o mercado de benefícios de alimentação e refeição para os trabalhadores. São mudanças que irão impactar profundamente o atual modelo de negócio das operadoras líderes do setor.
Uma das principais é o fim do rebate, um desconto concedido pelas operadora de benefícios às empresas clientes para que renovem o contrato. Outra, é a transição do modelo fechado para o aberto.
No modelo fechado, as operadoras tradicionais – Alelo, Ticket, Sodexo e VR – são responsáveis tanto pela emissão dos cartões de benefício, quanto pelo credenciamento e o pagamento da rede de serviços e comércio onde eles podem ser usados. No modelo aberto, cada etapa do processo pode ser feita por uma empresa diferente. O pagamento e o credenciamento da rede onde os benefícios são usados, por exemplo, pode ser entregue a bandeiras de cartão de crédito, que já são aceitas em um número muito grande de estabelecimentos.
Com esta facilidade, startups de benefícios — como a Caju e a unicórnio francesa Swile, que chegou ao Brasil em 2020 com a compra da pioneira Vee –, ganharam novo impulso e têm ajudado a movimentar o mercado.
A Alelo, uma das empresas líderes do segmento – Ticket, Sodexo e VR são as demais –, vem se preparando para mudanças desde 2018, quando iniciou seu processo de transformação digital. Em fevereiro de 2020, pouco antes do início da pandemia, a empresa uniu em uma única diretoria a área de negócios, marketing e estratégia digital. Sob o comando de Márcio Alencar, a Alelo tem investido em mudanças de processo, inovação e parcerias com ecossistemas empreendedores, como Inovabra, Distrito e Plug and Play.
“O modelo de trabalho híbrido veio para ficar, esse é um legado da pandemia. As empresas, especialmente as baseadas em serviço, não serão nunca mais 100% físicas. Os benefícios têm de se adaptar a essa realidade. Precisamos continuar investindo muito forte em inovação e agilidade para continuar liderando esse mercado de maneira responsável e criativa”, afirma Alencar, em entrevista exclusiva ao EXP.
Inovação na Alelo
“Iniciamos o processo de transformação digital há três anos. Hoje, a área de inovação é conectada ao negócio, sou responsável por todas as unidades de negócio da Alelo – B2B para o RH das empresas, B2B para o lojista e B2C para o cliente pessoa física – além de novos negócios, como o Pede Pronto, aplicativo de pedidos de comida que compete em um mercado diferente do da Alelo. Marketing, aquisições e o Laboratório de Inovação (Lab) também estão sob minha gestão.”
Lab
“O Lab opera de maneira consultiva, trabalhando a cultura da inovação nas áreas de negócio. Temos 15 pessoas dedicadas à agenda de inovação, incluindo os times diretos e indiretos. O foco deles é antecipar questões relacionadas ao futuro, o que será tendência em um ou dois anos. O time desenvolve MVPs (produto mínimo viável, na sigla em inglês) para testar hipóteses com um pequeno grupo de clientes e validar se algo é viável economicamente ou não.”
Inovação aberta
“Uma das primeiras parcerias foi com o Inovabra, devido à nossa relação societária com o Bradesco. Depois, vieram a Plug and Play, a plataforma Distrito e outros centros de inovação do país. Normalmente, lançamos um desafio a partir das necessidades de negócio e as startups apresentam soluções para acelerar o processo de geração de valor para o cliente.”
Novos produtos do Lab
“Posso citar algumas frentes que deram muito certo. Uma foi o atendimento por WhatsApp, que reduziu nosso custo de atendimento, aumentou a eficiência da área e melhorou a experiência do cliente. Outra foi a criação de dois produtos para lojistas, o Mais Clientes e o painel Meu Negócio, que usam informações do nosso datalake para ajudar na gestão do estabelecimento.”
Mudanças e inovação na pandemia
“A Alelo já trabalhava o conceito de anywhere office antes da pandemia. Portanto, a virada para o home office foi instantânea. Já havia uma cultura de trabalho remoto bastante forte.”
“Do ponto de vista do mercado, tivemos uma mudança de hábito importante relativa ao uso do benefício, devido à restrição de movimentação. No primeiro semestre de 2020, houve uma queda de mais de 50% no consumo em restaurantes. Para apoiar as empresas, habilitamos rapidamente a migração automática do benefício alimentação e refeição por parte do RH, já que a própria reguladora impede que essa mudança seja feita pelo usuário.”
“A Alelo apoiou os lojistas na virada para o digital. Conectamos rapidamente as plataformas de pedido para viabilizar alternativas de venda além do balcão. No final de 2020, compramos uma startup e criamos o aplicativo Pede Pronto, nossa frente de negócios voltada aos pedidos digitais.”
“Lançamos o Alelo Tudo, que faz a junção de três produtos – alimentação, refeição e outros benefícios como farmácia e postos de gasolina – em uma única mídia. Isso facilitou a logística de distribuição dos cartões, permitindo a entrega direta para o usuário. Antes, a distribuição era feita pelo RH da empresa.”
Mudanças na Lei do PAT
“Nos últimos anos, a competição trouxe instrumentos não positivos para o mercado, trazendo certo desequilíbrio. Para existir o rebate para o RH, a contrapartida é um custo mais alto para o lojista, traduzido em taxas. É uma dinâmica que a gente vinha apontando há algum tempo para o regulador. Por meio de nossa associação, a ABBT (Associação Brasileira das Empresas de Benefícios ao Trabalhador), participamos ativamente da construção desse novo PAT. Tivemos uma enorme quantidade de audiências em consulta pública com o Ministério do Trabalho e com as novas empresas que têm entrado nesse setor. Houve uma discussão muito ampla e diversa do ponto de vista de opiniões e de visões sobre o programa.”
Taxas altas para os lojistas
“Outra ação que a ABBT apoia é uma iniciativa da Abrasel (Associação de Bares e Restaurantes), o OpenDelivery, que simplifica e padroniza o serviço de delivery de bares e restaurantes, facilitando a integração destes por meio digital.”
“Com relação às taxas, no modelo de arranjo fechado, em que a operadora emite, processa e liquida o benefício, o custo para o lojista é, em média, 30% mais alto do que no arranjo aberto. Com as mudanças nas regras do PAT e a passagem definitiva para o modelo aberto, a tendência natural é que essas taxas caiam e sejam as mesmas do arranjo aberto em dois a três anos.”
Riscos do modelo aberto
“Em 2017, o governo criou um programa que permitiu que empresas pudessem contratar auxílios diversos para os trabalhadores, além dos previstos no PAT. O modelo de arranjo aberto permitiu a entrada das bandeiras e dos adquirentes no processo. Diferente do arranjo fechado, em que a operadora é responsável por toda a cadeia, no modelo aberto surgem centenas de credenciadores e subcredenciadores.”
“Hoje, o cadastro dos lojistas é feito com base em sua CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas). Porém, os estabelecimentos têm diversas CNAES e acabam selecionando a que lhes dá melhor vantagem econômica. Isso permite que um estabelecimento cadastrado como restaurante – e apto a receber o dinheiro do benefício alimentação ou refeição – seja, na prática, uma borracharia, ou uma loja de conveniência de posto de gasolina.”
PAT X benefícios flexíveis
“Está havendo uma confusão muito grande entre os benefícios do PAT e a política de benefícios flexíveis das empresas. O PAT deve ser usado para alimentação e refeição, não para pagar academia. Temos um desafio de gerenciar melhor esse processo para salvaguardar o objetivo original do programa, que é alimentar melhor o trabalhador brasileiro, dar condições para que ele tenha uma alimentação saudável.”
Portabilidade
“Entre as mudanças na lei do PAT está a portabilidade. Acredito que essa seja uma evolução importante para o mercado, desde que se observe o foco deste processo, que é o usuário.”
“Apesar disso, não se pode esquecer o RH das empresas, que é quem contrata os benefícios e vai definir os parceiros que quer ter no processo.”
“Assim como a portabilidade bancária ou telefônica fez com que os bancos e as operadoras melhorassem sua oferta de serviços e produtos, vejo esse movimento como algo produtivo e importante para o mercado como um todo.”
Foto: divulgação e Prostock-Studio
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