Mercado

Mercado de benefícios: como as empresas estão se adaptando às novas regras do PAT

Mudanças entram em vigor em 1o de maio de 2023, mas regras da portabilidade ainda não foram definidas pelo governo

Por Monica Miglio Pedrosa

O mercado de benefícios está passando por intensas mudanças desde a publicação do Decreto 10.854, de novembro de 2021, ratificado pela Lei 14.442, de setembro de 2022, que muda o Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT). Entre os pontos mais polêmicos estão o fim do rebate – os descontos oferecidos pelas operadoras de benefícios na renovação de contratos com empresas –, a permissão de usar os tíquetes em qualquer estabelecimento que aceite este tipo de pagamento e a portabilidade de crédito para outro cartão de bandeira diferente. [Veja as alterações no quadro abaixo]

Essas mudanças têm trazido impactos em um setor que movimenta cerca de R$ 150 bilhões por ano e hoje é dominado por quatro grandes operadoras – VR, Alelo, Sodexo e Ticket. O objetivo da nova lei é justamente ampliar a concorrência e estimular a inovação do setor, em especial com a entrada de novos players no mercado brasileiro, como Swile, Caju, Flash e Creditas. [Leia mais sobre esta movimentação de mercado no Report O Novo Playbook do Mercado de Benefícios]

 

 

As alterações entram em vigor a partir de 1º de maio de 2023, de acordo com a Lei. Executivos de RH falam sobre o impacto destas mudanças em suas empresas e no setor como um todo.

Principais impactos positivos no setor

Como o próprio governo afirmou ao editar o decreto, um dos objetivos da mudança é abrir o mercado e ampliar a competitividade do setor. Na prática, empresas menores também passaram a ter acesso a benefícios antes reservado às grandes. “Aumentando a concorrência, aumenta a inovação e o nível de serviço”, diz Daniel Spolaor, CEO e cofundador da startup Korú, que capacita pessoas em tecnologia e vendas e oferece treinamentos corporativos.

O executivo, que foi CHRO de grandes empresas como Ambev e Falconi, aponta que hoje, à frente de uma startup com 100 pessoas, o acesso às grandes operadoras de benefício e seus parceiros lhe dá um diferencial competitivo na hora de atrair talentos. “Isso democratizou o acesso para empresas menores e as coloca em pé de igualdade na disputa por talentos, já que antes as empresas maiores tinham acesso a estes benefícios por um custo menor devido ao rebate.”

Novos players

A flexibilização das regras possibilitou o aparecimento de novos players que oferecem benefícios flexíveis e usam de tecnologia para interagir com todos os elos da cadeia – RH das empresas, colaboradores e estabelecimentos de alimentação. A Swile, empresa francesa que se tornou unicórnio no final de 2021, foi a primeira gigante a chegar no mercado brasileiro, adquirindo de Marcelo Ramos a pioneira no país, a Vee.

Outros players, como a Caju e a Flash Benefícios, também têm conquistado o mercado. Com a permissão de uso de cartão refeição e alimentação bandeirado, o que é conhecido como modelo de arranjo aberto, qualquer estabelecimento que aceite a bandeira pode ser usado pelos colaboradores.

Flexibilidade e inovação

O grande diferencial destes negócios que já nascem digitais é o investimento em aplicativos e tecnologia que permitem a customização do uso dos benefícios, facilitando a vida do usuário. Foi o que fez a TOTVS, empresa de tecnologia com 8.500 colaboradores, trocar de operadora no fim de 2022, da Alelo para a Swile.

“Foram vários os fatores de decisão: precisávamos de um fornecedor que tivesse flexibilidade, disponibilidade e capilaridade, por estarmos em quase todo o país”, conta Izabel Branco, Vice-Presidente de Relações Humanas da TOTVS. Também contaram pontos a facilidade no uso do aplicativo pelo colaborador e as funções de backoffice oferecidas pela empresa, como o envio e rastreio do cartão para os colaboradores.

A abertura do mercado também trouxe flexibilidade no uso dos benefícios, na avaliação de Gianpiero Sperati, CHRO da Gupy. “Faço um paralelo com o tempo em que só tínhamos a TV aberta, com uma programação fixa: ou você via no horário estipulado ou perdia seu programa. O mesmo se dá com os benefícios e isso ficou muito evidente durante a pandemia, com a migração para o home office. Cada funcionário tem um hábito de consumo, alguns querem usar todo o tíquete em alimentação pois não comem mais fora. Também querem escolher se preferem ir à academia ou investir em saúde mental”, afirma.

O impacto nos grandes players

Desde o anúncio das modificações, as principais operadoras de benefício do mercado têm se adaptado às mudanças, ampliando o número de parceiros para a oferta de benefícios além da alimentação e investindo em tecnologia. A Alelo é um dos grandes players que vem apostando em sua transformação digital desde 2018, e criou até um novo negócio, o Pede Pronto, um aplicativo de pedidos de comida.

O fim do rebate e a mudança do modelo de arranjo fechado para o aberto deve reduzir os custos com as operações dos tíquetes dos estabelecimentos que oferecem refeições ou alimentos em até 30%, segundo estimativa de mercado. Márcio Alencar, CDO, CMO e CPO na Alelo Brasil acredita que isso ocorra nos próximos 2 anos, mas alerta para alguns riscos do modelo aberto: “Diferentemente do arranjo fechado, em que a operadora é responsável por toda a cadeia, no modelo aberto surgem centenas de credenciadores e subcredenciadores. Um estabelecimento que tem diversos CNAES (Classificação Nacional de Atividades Econômicas) pode ser cadastrado como um restaurante e ser na prática uma borracharia, ou uma loja de conveniência, e o valor do PAT deve ser usado para uma boa alimentação ou refeição”, afirmou ele em entrevista ao [EXP] quando a mudança começou a repercutir no mercado.

 

A queda do preço nos estabelecimentos também não pode ser dada como certa. “Há um risco de isso não ser revertido para as pessoas. Empresas que tinham um desconto via rebate e usavam esse dinheiro para conceder outros benefícios fora os de alimentação, agora terão de assumir esse custo adicional no seu orçamento”, diz Daniel Spolaor, CEO da Korú. Para o executivo, no curto prazo a tendência é que o reajuste regulatório não promova redução nas taxas dos estabelecimentos, e consequentemente no valor da alimentação para o trabalhador, já que as operadoras de benefício terão que reequilibrar seus custos com a perda de clientes.

“Antes era mais fácil para as grandes operadoras, pois elas tinham contratos vigentes de 2 a 3 anos, com um modelo de negócio mais simples, e a prática do rebate. Agora elas vão ter de renovar seus contratos com uma oferta de valor diferente”, analisa Daniel.

Portabilidade em compasso de espera

Um dos itens da nova Lei do PAT é a possibilidade que o beneficiário terá de transferir o crédito acumulado para outro cartão, de bandeira diferente, sem custos adicionais. No entanto, essa medida ainda depende de regulamentação. A portabilidade será implementada pelo Ministério do Trabalho e Previdência, com a participação do Banco Central e ainda não há avanços mais concretos anunciados sobre essa questão.

A indefinição deixou o mercado em compasso de espera. “Fico imaginando que esse processo deveria ser como a portabilidade da previdência, então a princípio é algo que impactaria mais as operadoras de benefício”, diz Izabel Branco, da TOTVS. A executiva também não acredita que os funcionários da TOTVS teriam interesse na portabilidade, já que a oferta atual oferece amplo acesso à rede de atendimento, por ser um cartão bandeirado e oferecer flexibilidade nos benefícios.

 

Considerando algumas práticas de portabilidade nos mercados de telefonia e bancário, as operadoras poderiam adotar políticas de oferta de benefícios ou até mesmo cashback para atrair os funcionários de outra bandeira. Mas tudo depende do que será definido pelo governo.

“Lembro de outras mudanças na lei que também causaram o mesmo frio na barriga, como o E-social. Foi um processo complexo de migração, pois havia muitas exceções e situações a serem definidas pelo governo que ficaram em aberto em um primeiro momento”, lembra Gianpiero Sperati.

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