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Pier usa programa de indicação para reduzir risco (e preço) de seguro

Insurtech, considerada pelo mercado candidata a se tornar unicórnio em 2022, espera quadruplicar o resultado e alcançar receita anualizada de R$ 240 milhões, em dezembro, com apólices contra roubo e furto para celulares e automóveis

O crescimento de startups com atuação no mercado de seguros, as chamadas insurtechs, tem impulsionado a inovação no setor, particularmente no último ano. O movimento teve como pioneira a Pier.

Fundada em 2017, a startup foi a primeira a obter a licença de seguradora pelo Sandbox regulatório da Susep (Superintendência de Seguros Privados). O sandbox é um ambiente regulatório experimental e supervisionado, com regras mais flexíveis que as do mercado traidional, criado para dar impulso a inovação no setor.

A insurtech iniciou oferecendo um seguro contra roubo e furto de celular e, com ele, quebrou uma série de paradigmas do segmento: seu produto não tem período de carência, franquia nem fidelidade. Além disso, a startup passou a aceitar furto simples para pagamento do benefício. Depois, a empresa entrou também no segmento de automóveis, que a ajudou a alcançar 76 mil clientes e faturamento anualizado de R$ 60 milhões, em dezembro do ano passado.

“Queríamos provar que é possível fazer um seguro honesto para os consumidores”, conta Igor Mascarenhas, cofundador e CEO da Pier.

No site Reclame Aqui, a empresa tem hoje nota 9, em uma escala de zero a dez, e 99,3% das reclamações respondidas.

Para oferecer os novos benefícios aos segurados, segundo Mascarenhas, a Pier usa um modelo de precificação baseado em inteligência de dados e inteligência artificial que considera diversas informações mas, principalmente, a indicação de outros clientes da empresa. “Mais de 14% dos sinistros no Brasil são considerados suspeita de fraude, e quem paga a conta é a pessoa honesta. Com a indicação, conseguimos reduzir em 30% o preço médio do seguro em relação ao mercado”, afirma. 

Este ano, a startup obteve autorização para atuar com licença definitiva no Brasil e espera, já nas próximas semanas, alcançar a marca de 100 mil clientes. Se tudo correr como Mascarenhas e seus sócios esperam, o faturamento vai quadruplicar, chegando a R$ 240 milhões, até o final de 2022.

Os bons resultados tentem a atrair novos investidores, que podem ajudar a empresa a se tornar o primeiro unicórnio do setor de seguros no Brasil. A empresa é uma das apostas do mercado para este ano.

Até aqui, segundo o Crunchbase, a Pier já recebeu US$ 42,1 milhões em aportes, em três rodadas. Na mais recente, em setembro do ano passado, levantou US$ 20 milhões com um grupo de investidores liderados pela Raiz Investimentos, que incluiu ainda Canary, Monashees, Mercado Livre e BTG.

Confira a seguir os principais destaques da entrevista da EXP com Mascarenhas:

Aprendizados pré-Pier 

“Trabalhava em uma consultoria de inovação, em 2013, quando o governo criou um programa de fomento a startups no Brasil, em parceria com a Unesco, o Start-Up Brasil. À época eles queriam investir em aproximadamente 200 empresas, em parceria com aceleradoras. Como tive acesso a um número grande de negócios, percebi os principais problemas que podem acontecer em startups: desacordos societários entre empreendedores, produtos que não tem mercado, entre outros.”

“Em 2016 estava na Startup Farm, uma aceleradora com mais de 300 empresas no portifólio. Em parceria com a Visa, investimos em startups do mercado financeiro. Nessa época, já existiam startups de crédito, finanças pessoais e pagamento. Mas não havia nenhuma tese de seguros. Isso já me chamou a atenção, pois era um mercado subpenetrado, grande, com um impacto social importante.” 

Seguro de celular para provar a tese

“Iniciamos a Pier em 2017: eu e meus sócios, Lucas Prado e Rafael Oliveira. Começamos pequenos, pois queríamos provar que é possível fazer um seguro honesto para as pessoas, com respeito aos consumidores.” 

“O seguro de celular tinha um mercado potencial enorme e havia uma demanda clara: à época, nenhum seguro cobria furto simples. As seguradoras também exigiam um período de carência e não deixavam isso claro para os usuários. Lembro que faziam campanha de venda de seguro de celular para o Carnaval em fevereiro. Mas, na verdade, a carência não permitiria usufruir do benefício caso houvesse algum sinistro. Nós queríamos um produto honesto, sem pegadinha.”  

“Somos uma empresa baseada em dados e fazia muito sentido iniciar o negócio por seguro de celular, que é uma rica fonte de informações do usuário.” 

Programa de Indicação 

“Temos que lembrar a essência do seguro, que é o mutualismo. São pessoas se ajudando caso alguma delas tenha um problema. Faz todo o sentido que pessoas que contratem um seguro indiquem outras que potencialmente manterão a honestidade no processo. Hoje, mais de 14% dos sinistros no Brasil são suspeitas de fraude. E quem paga a conta é a pessoa honesta.” 

“Não fui eu quem inventei a indicação para o seguro. Yunus criou um banco de baixa renda para mulheres baseado em indicação, o que permite reduzir os custos do seguro e minimizar os efeitos do score de crédito bancário.” 

“Hoje qualquer um pode pedir um seguro no site. Mas se ele é indicado por um membro e recebeu um convite para entrar, facilita nosso modelo de subscrição na tomada de decisão.” 

“Com nossos modelos baseados em dados, em 90 dias  temos 300 vezes mais informação do que qualquer incumbente sobre um único cliente.” 

Maior seleção na entrada, celeridade no pagamento 

“Costumamos dizer que somos muito rigorosos na entrada de membros, para que possamos ser muito mais rápidos no pagamento em caso de eventual sinistro. Hoje, 20% dos nossos pagamentos são instantâneos – o cliente envia a documentação do sinistro e recebe o valor segundos depois. Além disso, ao trazer pessoas que você confia para o grupo, isso permite gerar um preço muito mais atrativo. Hoje, nosso preço médio é 30% mais baixo que o de mercado.”

Relação de confiança 

“Tivemos um caso de furto de celular em que a Pier pagou o membro logo após o sinistro. Algum tempo depois, esse cliente nos procurou dizendo que a polícia havia encontrado o aparelho perdido e que ele fazia questão de devolver o celular para o grupo. Ele disse que se sentiu tão respeitado pela Pier que queria contribuir de volta e ajudar a reduzir o risco da comunidade.” 

“Em contrapartida, na pandemia, no ápice da primeira onda da Covid-19, em que as pessoas ficaram em casa e o risco de sinistro diminuiu, reduzimos os preços do seguro. Que eu saiba somente a Pier teve essa postura. É esse respeito ao usuário em todas as instâncias que nos faz ter a credibilidade da comunidade.”

Modelo de negócios baseado em comportamento 

“Para precificar um seguro hoje é muito mais importante o comportamento do usuário do que a velocidade com que ele dirige, por exemplo, no caso do seguro de automóveis. O volume de fraudes em países emergentes é tão grande que mesmo fazendo um ajuste fino no comportamento de pessoas que andam a 50 km por hora, não haverá redução substancial de valor no prêmio do seguro.” 

“Estamos mais preocupadas em garantir que as pessoas sejam respeitosas, tenham uma postura adequada no dia a dia, do que saber a velocidade com que ela anda. O core do nosso modelo é o quão transparente, honesto e respeitoso uma pessoa é – e é isso que irá reduzir o risco de fraudes e o valor do seguro em si.” 

“Hoje, mais de 14% dos sinistros no Brasil são considerados suspeita de fraude e quem paga a conta é a pessoa honesta. Com a indicação, conseguimos reduzir em 30% o preço médio do seguro na comparação com o mercado.”

Crescimento sem perder qualidade  

“Em primeiro lugar vem o que chamamos de ‘Experiência Pier’. Queremos crescer, claro, mas sem perder nossas características de excelência. De 2020 para 2021, crescemos quatro vezes, atingindo R$ 60 milhões de faturamento (valor anualizado, com base na receita de dezembro). A meta para dezembro de 2022 é chegar a R$ 240 milhões.” 

“Outra meta interna nossa é chegar a 35% de reembolso instantâneo até o final do ano. Atualmente, 20% dos nossos pagamentos são imediatos.” 

Cultura como vantagem competitiva 

“Temos muito orgulho do nosso time, hoje somos 200 colaboradores, 40% deles trabalhando com produto e tecnologia. Acreditamos que um ambiente de trabalho saudável e que entrega muita qualidade é uma vantagem competitiva. Todo mundo pode copiar nosso produto, nosso aplicativo. Mas ter um ambiente que propicia a excelência como a Pier é muito difícil de ser replicável. É um dos nossos diferenciais.” 

Público-alvo  

“Temos uma forte correlação com nativos digitais, uma concentração maior em grandes cidades de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais e uma predominância na faixa etária de 18 a 45 anos. É um usuário que gosta de autonomia, de ter a liberdade para tomar as próprias decisões. É alguém informado, consciente de sua vida financeira e da importância de ter um seguro.”  

Mercados potenciais para as insurtechs 

“Vejo três grandes blocos de atuação das insurtechs. O primeiro é composto por insurtechs B2B, que prestam serviços para seguradoras, entregando tecnologia para sinistro, prevenção a fraudes ou eficiência para os processos do back-office.” 

“Outras insurtechs estão focadas na cadeia de distribuição. Elas entregam um produto diferente, mais transparente, para consumidores que têm alguma experiência digital.” 

“Por fim aparecem as insurtechs com foco na subscrição do risco, que é quem compra efetivamente o risco, como a Pier.” 

Infraestrutura tecnológica proprietária 

“A Pier desenvolveu todo seu sistema de gestão das apólices. Hoje, quando o usuário entra no nosso aplicativo ele interage conosco de ponta a ponta – desde o módulo financeiro, de pagamentos, contratação do seguro e mudanças nas apólices. O cliente dispõe de atendimento humano e, devido ao sistema ser proprietário, o atendente consegue executar todas as solicitações. Aquela história de que o cliente quer trocar o número do cartão de crédito ou o endereço e não consegue por limitações no ERP da seguradora não existe na Pier, porque mudamos a cadeia inteira do processo.” 

Previsões de futuro 

“Seguros é a próxima onda de disrupção no mercado financeiro. O nível de penetração no Brasil é muito baixo e esse é um produto que ajuda as pessoas no momento em que elas mais precisam.” 

“Acredito fortemente que a indústria de seguros vai ser disruptada pela inteligência artificial. Teremos cada vez mais sensores que ajudam o usuário a ter o entendimento do risco.”  

“As marcas de propósito serão uma exigência na vida do consumidor no futuro. Se você olhar a indústria de alimentos, há 20 anos ninguém se preocupava com a tabela nutricional de um produto. Hoje, o consumidor cuida de sua saúde e as informações dos alimentos fazem parte da tomada de decisão. Marcas que geram um impacto positivo na sociedade e trazem um propósito serão escolhidas pelos consumidores. É importante deixar um legado positivo na sociedade e é nisso que a Pier acredita.” 

Texto: Monica Miglio Pedrosa

Foto: divulgação e Antonio Guillem / iStock  

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