“Startups perdem ao não ver o governo como um cliente em potencial”
Segundo Guilherme Dominguez, o CEO do hub de aceleração BrazilLab, sustentabilidade, educação, saúde, segurança da informação, otimização de processos e compras públicas são os setores com as maiores oportunidades para govtechs
A crescente necessidade de digitalização e transformação digital no setor público, em especial após a pandemia, tem impulsionado o surgimento e crescimento de startups com soluções de inovação tecnológica para o poder público, as chamadas govtechs. Fundos como GovTech Brasil, Astella Investimentos e Dome Ventures criaram aportes específicos para o segmento, que vem ganhando força também com a promulgação recente de três novas leis: o Marco Legal de Startups, a Lei de Governo Digital e a Nova Lei de Licitações de Compras Públicas.
Se por um lado as oportunidades no setor se ampliam, por outro ainda há um trabalho importante de sensibilização, tanto do gestor público quanto dos empreendedores, que desconhecem os caminhos legais para fazer negócios com o governo. Esse foi um dos motivos da criação do BrazilLab em 2016, primeiro hub de aceleração especializado em govtechs.
Em entrevista ao Experience Club, o CEO do BrazilLab, Guilherme Dominguez, conta quais são os principais desafios a serem vencidos para impulsionar a inovação no setor público e indica as áreas de maior oportunidade para govtechs.
O início
“Somos a primeira organização 100% dedicada à agenda govtech no Brasil e os primeiros a criar um programa de aceleração de startups govtech no país. Surgimos em meio à Lava Jato, que revelou uma crise de confiança política muito grande. Queríamos colocar nossa energia para fazer alguma coisa verdadeiramente transformadora: provocar startups para que elas se tornem um dos caminhos para construir novas relações público-privadas com o uso da tecnologia e conectá-las às necessidades de inovação das prefeituras.”
Vencendo preconceitos
“Os empreendedores em geral não gostam de vender para o governo, pois acreditam que ele só serve para arrecadar impostos e impor burocracias. Mas ignorar o potencial de compra do governo é perder importantes oportunidades de negócio. O Estado é o maior comprador do Brasil em todas as áreas. A maior rede de escolas e de hospitais são públicos. Vender para o governo traz uma escala gigantesca para o negócio.”
De B2B a B2G
“Nos três primeiros anos de atuação, nosso foco era buscar soluções para necessidades das prefeituras. O primeiro programa de aceleração de startups tinha temas bem amplos: educação, saúde, meio ambiente. Buscamos saídas para estes grandes desafios públicos e convidamos startups que tinham estratégia B2B a pivotar seu negócio para B2G (business to government).”
“Na primeira edição foram 50 inscritos para 15 vagas e os vencedores implementavam pilotos nas prefeituras conveniadas ao hub. Hoje, estamos na sexta edição do programa e recebemos 300 inscrições para 15 vagas. No total, tivemos mais de mil inscrições de startups em todas as edições.”
Eventos e comunicação
“Nas turmas de aceleração, sempre trazíamos conteúdos direcionados para eles e palestras abertas para o público em geral. Também convidamos vencedores de edições anteriores para compartilhar conhecimento e aprendizados com os novos entrantes. Esse papel precisou ir além dos programas de aceleração e hoje temos uma vertical de eventos e produção de conteúdo para sensibilizar gestores públicos e empreendedores sobre o tema. Também produzimos estudos como o guia ‘Startups GovTech e o futuro do governo no Brasil’ e ‘Como estimular as compras públicas de inovação no Brasil’, ambos disponíveis em nosso site.”
Advocacy e nova leis
“Trazer empreendedores para as necessidades do setor público não era suficiente. Entendemos que precisávamos trabalhar também com o gestor público, familiarizá-lo com a contratação de novas tecnologias e o processo de inovação aberta. Nada disso seria possível sem a facilitação de leis que impulsionassem essa conexão entre ambos. Isso acabou culminando em uma frente de advocacy (ações voltadas a influenciar a e a alocação de recursos públicos), que iniciou, no final de 2017, um movimento pela modernização da legislação de compras públicas no Brasil.”
“No início de 2018, fui convidado para fazer o capítulo de compras públicas dentro do Marco Legal de Startups, que foi a primeira de três importantes leis surgidas nos últimos anos: a Lei de Governo Digital – que alguns chamam de Lei de Govtech –, que impulsionou a necessidade de digitalização dos serviços públicos, e a Nova Lei de Licitações de Compras Públicas, que abriu espaço para a contratação de soluções inovadoras.”
Áreas de oportunidade para GovTechs
“Saúde e educação sempre serão prioridade. Outros temas que têm crescido são: sustentabilidade – pegada de carbono, monitoramento e risco de desastres ambientais –; softwares de gestão de processos e procedimentos administrativos; melhoria de eficiência na arrecadação e no controle de despesas; atendimento; softwares de otimização de compras públicas e segurança da informação. Imagine que com o trabalho home office, funcionários de serviços públicos críticos passam a acessar dados sensíveis de casa e o investimento em segurança da informação será cada vez mais uma necessidade.”
Investidores e GovTechs
“Há dois anos, quase não havia interesse dos fundos de investimento privados. Mas após a pandemia e a necessidade de digitalização de diversos serviços e processos públicos, não só o número de govtechs tem crescido como também o de investidores de olho nas oportunidades desse setor.”
“Alguns exemplos são a Dome Ventures, venture builder que reservou R$ 10 milhões para o desenvolvimento de startups govtech; a Astella Investimentos, que já fez aportes na Aprova Digital e na Gove; o fundo GovTech Brasil, criado pela KPTL e Cedro Capital, que prevê captar até R$ 100 milhões para investimentos no setor; e o BNDES Garagem, que financia startups com soluções de impacto social e ambiental.”
Desafios a serem vencidos
“Do lado dos empreendedores são dois os principais desafios: o primeiro é o desconhecimento da legislação, que tem aberto caminhos para a atuação de startups, bem como a compreensão da dinâmica do processo de compra pública. Em segundo, a criação de soluções que tenham potencial de escala no setor público, com fácil setup e ótima experiência de uso.”
“Do lado do setor público, há um desconhecimento da aplicação das novas leis que foram criadas para facilitar o uso de soluções inovadoras de startups na gestão pública. Existe uma grande necessidade de letramento digital e de visão estratégica em transformação digital por parte dos gestores públicos. Falta qualificação sobre o uso da tecnologia no longo prazo.”
Texto: Monica Miglio Pedrosa
Foto: divulgação
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