ESG

A liderança feminina traz aspectos imprescindíveis para as empresas

Carla Assumpção

Por Denize Bacoccina

Carla Assumpção é uma pioneira na Swarovski Brasil, desde o tempo em que as pessoas perguntavam, ao ouvir o nome da empresa, se era uma marca de vodca. Hoje, 23 anos depois, ela é diretora-geral da companhia no Brasil, Chile e Argentina. A Swarovski tem cerca de 85 lojas no Brasil e 6,5 mil no mundo, em 170 países. O faturamento mundial, que havia caído nos anos da pandemia, voltou a crescer no ano passado, e chegou a 1,8 bilhão de euros.

Fundada em 1895 em Wattens, na Áustria, a Swarovski ainda produz todos os seus cristais no mesmo local. A diferença é que, hoje, a linha de produtos foi atualizada, com peças maiores e mais coloridas, mais ligadas à moda. Um rebranding que foi muito bem recebido no Brasil, diz Carla, onde as consumidoras gostam de ousar e de experimentar novidades. Na busca por rejuvenescer a marca, a Swarovski tem investido em parcerias com artistas, designers e influenciadores.

Nesta entrevista, Carla fala ainda sobre o espaço da mulher no mundo corporativo, e a diferença que vê no modo feminino de liderar. “Esse aspecto mais humanizado de uma liderança feminina, eu vejo como sendo um espírito do tempo necessário”, afirma.

[EXP] – Carla, você já está na Swarovski há mais de 20 anos. Conta um pouco da trajetória da empresa no Brasil e da sua trajetória na empresa.

Carla Assumpção – A Swarovski começou no Brasil de um jeito diferente. Como indústria, fornecendo os cristais como componentes, fazendo parcerias com marcas brasileiras, parcerias de moda com São Paulo Fashion Week, designers.

A minha trajetória profissional se confunde com a história da Swarovski no Brasil, porque eu praticamente iniciei na companhia quando a empresa entrou no país. E, naquela época, quando a gente fazia focus group, as pessoas achavam que era nome de vodca, porque é um nome muito diferente para um consumidor que não conhecia a marca.

E sempre no mercado de luxo?

Ela sempre transitou nesse mercado que a gente chama de mercado de luxo acessível. Em 2001 iniciamos a operação de varejo para o Brasil. E hoje temos mais de 85 lojas no país.

E hoje, como é o mix de produto?

Quando a Swarovski foi pro varejo, foi com os bichinhos colecionáveis. Quem conhecia a marca, conhecia de aeroportos, comprava pra levar de presente. A joalheria de acessórios era uma parte do nosso mix de produtos. Hoje ela representa 90% do nosso portfólio.

E no Brasil tem alguma diferença em relação ao mix de produtos de outros países?

Não tem diferença de mix. A Swarovski fez um rebranding depois da pandemia e vem trazendo produtos maiores, onde a pedra acaba tendo uma relevância muito maior na composição do design. A consumidora brasileira teve uma adesão muito rápida a esses produtos, porque ela atrela o acessório à moda, explora cores, tamanhos, volumes e formas.

Então, em termos de produto não há diferença, mas em termos de adesão a esse novo conceito, o Brasil saiu na frente de muitos mercados maduros. A brasileira gosta de se decorar, não tem medo de ousar. A consumidora chilena, por exemplo, tem um olhar diferente pra design, é mais minimalista, gosta de peças menores, mais clássicas. Então os produtos são os mesmos, mas a composição você acaba regulando de acordo com o seu olhar e o seu conhecimento do perfil do consumidor. Até entre lojas existe um mix diferenciado porque há consumidores distintos dependendo da região.

E esse rebranding é mundial? Ele está ligado a este momento pós-pandemia?

É mundial. Era um rebranding já pensado antes, uma estratégia de ressignificar a marca que já vinha sendo encubada dentro da companhia há algum tempo. Mas ele foi essencial nesse momento pós-pandemia, para levar a marca para os próximos cem anos. Foi uma conjunção de fatores, uma questão de espírito do tempo mesmo.

Temos essa estratégia, LUXignite, com várias frentes, desde a comunicação, estratégia de produto, e desejo da marca. Hoje você vê uma Swarovski no Met Gala sendo usado por Harry Styles, por Beyoncé na sua turnê Renaissance, o Pat McGrath usando Swarovski num desfile da Schiaparelli. Esse tipo de collab, que a gente chama de momentos de marca, acaba impactando o consumidor. Ele vê o estilo tanto na influenciadora global quanto local.

É pra dar uma modernizada na linha de produtos?

Sim, uma rejuvenescida, sem perder o nosso consumidor leal. Por isso nós nos nomeamos uma empresa de luxo acessível. Porque luxo e acessibilidade não necessariamente são antagônicos. Luxo é mais um conceito, que você explora através de um modo de consumo. Nós conversamos com esse consumidor que olha a Swarovski de um jeito mais clássico, porque ele ainda detém grande parte do volume. Enquanto a gente recruta esse cliente mais jovem, que é mais fascinado por esses momentos de marca, com celebridades, com o que está acontecendo no mundo da música, no mundo cultural. Então temos esse equilíbrio entre os dois lados: construir o futuro da marca, sem deixar de olhar o legado.

E o que é o futuro no mercado de luxo? Qual é a tendência?

Na Swarovski, eu vejo o futuro muito voltado para a autenticidade. Eu acho que não existe um consumidor único, exclusivo, que goste de um único estilo. Queremos ter esse ouvido, esse radar para o mercado, entender essas transformações e reagir muito rápido, como ela vem fazendo. No seu ponto de venda, na transformação do seu produto, da sua comunicação, recrutando essa clientela diferente, mais jovem, mais antenada. É você reagir rápido, não necessariamente a uma tendência única e específica.

Como estão as vendas no Brasil?

No Brasil nós conseguimos surfar bem esta onda pós-pandêmica de consumo. Estamos tendo, desde a pandemia, anos excelentes de resultados, tanto em receita, como em lucratividade. O Brasil, o Cone Sul como um todo, em termos de tamanho ainda não é um mercado prioritário para uma empresa global como a Swarovski, mas a nossa performance é uma das maiores do mundo em termos percentuais e não em absolutos.

E como está a atuação no digital?

Nós temos o nosso Swarovski online, mas ainda não chegamos numa omnicanalidade perfeita. O que oferecemos é um atendimento online através de um de nossos representantes, com venda pelo site ou pelo WhatsApp, sempre com uma pessoa na ponta.

Você é uma mulher CEO e parte de uma minoria ainda muito pequena, infelizmente. Como você vê a evolução das mulheres da liderança das empresas, como analisa o que vem acontecendo nos últimos anos?

Eu vejo muita coisa boa acontecendo. Eu tive a grande sorte de fazer uma carreira muito consistente porque eu já venho de uma empresa pioneira nesse sentido, com uma base de mulheres no comando muito bem equilibrada. Então, eu sempre tive muitas oportunidades, mesmo sendo mulher. E eu vejo o quanto isso é benéfico. Nunca foi um desafio interno na companhia você fazer carreira por ser de qualquer grupo minoritário.

Agora, num olhar mais abrangente de mercado, eu vejo que as mulheres estão começando a fazer uma coisa que o homem sempre soube fazer muito bem, que é se vender melhor. Eu acho que o nosso grande trunfo é esse. Deixar de lado até certa timidez ou alguma insegurança. A mulher hoje tem muito mais ownership da sua carreira. Então a gente vê mudanças acontecendo de maneira interessante e eu considero exponencial. Mas tem muito ainda pra ser feito nesse sentido.

E você acha que existe um modo feminino de liderar?

Tenho certeza. Segundo o meu ponto de vista, obviamente. Primeiramente, eu sucedi um homem nessa posição e eu vejo as diferenças. Quando ele se sentava nessa cadeira, ele tinha uma equipe de apoio por trás e ele só era responsável pelo negócio em si. A casa era gerenciada por outras pessoas, as suas finanças, pela sua esposa. Ela cuidava de tudo da vida dele. E a hora que eu me sentei naquela cadeira eu era mãe, era dona de casa, eu organizava minhas finanças, então eu acho que existe ainda uma complexidade muito maior para a mulher, principalmente a mulher que tem outros papéis. E isso se reflete também na liderança.

Eu me vejo uma pessoa muito empática em relação a esses desafios diários que todos temos, não só as mulheres. E eu sei que eu não sou uma exceção, eu sou uma regra. Esse aspecto mais humanizado de uma liderança feminina, eu vejo como sendo um espírito do tempo necessário, independente do gênero que está ali sentado naquela cadeira.

Trazer esse aspecto mais feminino para uma gestão e para uma liderança, independente do gênero, eu vejo como sendo imprescindível.

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