A mentalidade do fundador: A chave para sua empresa enfrentar as crises e continuar crescendo
Autores: Chris Zook e James Allen
Ideias centrais:
1 – O primeiro componente da mentalidade do fundador é o senso de missão insurgente. Alguns fundadores de maior sucesso comparam a fase inicial do empreendimento a uma guerra em nome de clientes que não vinham sendo bem-atendidos. Outros criam um mercado totalmente novo, como a Netflix ou a SpaceX.
2 – Overload, ou sobrecarga, ocorre quando a empresa está crescendo de forma intensa. Conforme isso acontece, seus líderes tendem a descuidar da mentalidade do fundador.
3 – Das três crises previsíveis de crescimento, a queda livre é a mais perniciosa. No mercado, entre 5% e 7% das empresas estão em queda livre ou próximas disso. Somente cerca de 10% a 15% conseguem escapar vivas.
4 – Geoff Lloyd concluiu que, para salvar a Perpetual [gestora de recursos], teria que conduzir a empresa de volta à sua missão central, definida pelos fundadores, 150 anos atrás: proteger a riqueza australiana.
5 – Para vencer reiteradamente no plano externo, a empresa precisa vencer também no interno. E a melhor maneira de garantir que isso aconteça é abraçar a mentalidade do fundador.
Sobre os autores:
Chris Zook é sócio da Bain & Company e líder da prática global de estratégia. Seu trabalho se concentra em ajudar empresas a encontrar novas fontes de crescimento rentável.
James Allen é sócio do escritório de Londres da Bain & Company e também é líder da prática global de estratégia. Allen é o fundador do Bain Founder’s Mentality 100.
Prefácio:
Ao estudar crises de crescimento, volta e meia topamos com organizações como a Nokia – empresas que, para um observador externo, pareciam ter tudo (posição de mercado, marca, tecnologia, base de clientes, enormes recursos financeiros), mas acabaram deixando tudo escapar de modo impressionante, por não ter conseguido jogar o jogo interno. Mas também encontramos muita história marcante e inspiradora de natureza oposta, empresas que, olhando de fora, pareciam não ter qualquer esperança, mas que foram revividas por líderes que praticamente refundaram o negócio.
Uma dessas é a DaVita, que em 1999 parecia caminhar para a falência e que, hoje, virou uma das empresas de saúde de melhor desempenho nos Estados Unidos. Desde que Kent Thiry assumiu o comando e revelou publicamente a extensão dos problemas da empresa, o preço das ações se multiplicou por 100 e seu valor de mercado subiu de quase zero para US$ 15 bilhões. Thiry, que, passados quase 16 anos ainda é o CEO, iniciou essa transformação reenergizando a empresa internamente com a mentalidade do fundador.
Capítulo 1 – Founder’s mentality – a chave do crescimento sustentável
Três traços – missão insurgente, obsessão com a linha de frente e cabeça de dono – são os principais atributos da mentalidade do fundador e nossa pesquisa mostra que cultivar assiduamente cada um deles conduz ao sucesso.
Missão insurgente. O primeiro componente da mentalidade do fundador é o senso de missão insurgente. Como dissemos na introdução, alguns dos fundadores de maior sucesso comparam a fase inicial do empreendimento a uma guerra com o setor em nome de clientes que não vinham sendo bem-atendidos. É por isso que, no começo, Wexner fazia as reuniões da empresa no que chamava de “sala de guerra”. Outros fundadores disseram que seu propósito era redefinir as regras do respectivo setor. E, para outra leva, insurgência é criar um mercado totalmente novo, como a SpaceX está fazendo com viagens espaciais ou como a Netflix fez na TV via streaming.
Obsessão com a linha de frente. Essa obsessão é fundamental para a mentalidade do fundador e se manifesta de três formas: na obsessão com o pessoal da linha de frente, com cada cliente em todos os níveis da empresa e com os detalhes da operação. É essa mentalidade que Wexner imprimiu à L. Brands e é a mentalidade que o jovem M. S. Oberoi, que teve sua infância humilde no que hoje é o Paquistão, imprimiu ao Oberoi Group, uma das grandes bandeiras da hotelaria.
Cabeça de dono. Pequenas empresas têm uma grande vantagem competitiva sobre grandes incumbentes. Em qualquer nível de operação, funcionários de uma empresa pequena tomam decisões e perseguem suas metas com uma cabeça de dono. Em outras palavras, estão de tal modo comprometidos com o negócio, que pensam e agem como se a empresa fosse sua, algo que não pode ser dito dos níveis e mais níveis de funcionários e gerentes profissionais de grandes incumbentes.
Peguemos a AB InBev, a maior e mais rentável cervejaria do mundo, dona de um faturamento de US$ 50 bilhões, um valor de mercado de US$ 170 bilhões e margem de lucro de 32% – mais de dez pontos acima da média das maiores rivais. Embora muitos não botassem fé na empresa em seu início, a AB InBev superou em muito as expectativas ao cultivar assiduamente a cabeça de dono ao ir crescendo.
Um gerente da AB InBev que conhecemos durante nossa visita resumiu de forma memorável essa abordagem: “Criamos donos de restaurante, não garçons”, disse. “Se você tem um restaurante e inauguram outro bem na frente, servindo a mesma comida, como você se sente? Você sente que alguém está colocando sua sobrevivência em risco, ameaçando você, ameaçando sua família. É algo pessoal, pois o restaurante é seu sonho. Já se for um garçom e abrirem outro restaurante do outro lado da rua, como se sentiria? No máximo indiferente. Muita empresa, sem querer, cria garçons. Trabalhamos incansavelmente para criar donos de restaurante”.
Capítulo 2 – As três crises previsíveis do crescimento
O overload, ou sobrecarga, ocorre quando a empresa está crescendo de forma intensa. Conforme isso acontece, seus líderes tendem a descuidar da mentalidade do fundador. É um processo natural. O resultado, contudo, é que começam a perder aquilo que, lá no início, tornou a empresa fora de série. Complexidade, sistemas e processos emperram a organização, consome uma parte maior da rentabilidade e diluem o senso original de propósito. O overload acomete empresas que começam a crescer sem ter se preparado, no plano interno, para a pressão exercida pelo porte e pela complexidade.
A desaceleração do stall-out, ou estagnação, acomete empresas que conseguiram crescer e, agora, se debatem com os desafios da complexidade. Níveis crescentes de burocracia e disfunção interna ameaçam fundir os motores que levaram a empresa ao sucesso. É uma crise desnorteante: os lideres sabem que a empresa está perdendo embalo, mas, quando acionam os controles que antigamente usavam para acelerar ou mudar de direção, o efeito é mínimo. É visível que algo mudou. Mas, devido à complexidade da organização, fica difícil saber o que é exatamente, ou que providência tomar.
Queda livre. A queda livre pode ocorrer em qualquer ponto do ciclo de vida de uma empresa. É mais comum, no entanto, em incumbentes já estabelecidas cujo modelo de negócios está sob sério ataque de novas insurgentes (caso de livrarias atacadas pela Amazon) ou já não é tão viável em um mercado em transformação (caso da Blockbuster e do aluguel de vídeo em lojas físicas, quando surgiu o streaming).
Das três crises previsíveis de crescimento, a queda livre é a mais perniciosa. A qualquer momento no mercado, entre 5% e 7% das empresas estão em queda livre ou prestes a iniciar a descida. E o dado mais alarmante é que, dessas, somente cerca de 10% a 15% conseguem escapar vivas. Além disso, metade das que conseguem a proeza só sobrevive porque redefiniu radicalmente pelo menos parte do core business.
Capítulo 3 – Combater o overload
O que fazer quando o overload se instala? Para achar a resposta, voltemos à história da Norwegian Cruise Line, uma companhia que encalhou, apesar da forte posição em um mercado em expansão. Para rever o curso, ela teve de se reestruturar a partir da linha da frente e despertar novamente sua missão insurgente.
O novo CEO da Norwegian, Kevin Sheehan, tinha acabado de assumir e começava a perceber o verdadeiro abacaxi que tinha em mãos. Vítima de seu próprio crescimento acelerado, a empresa tinha saído da rota pela ação de ventos contrários. A missão de Sheehan era fazer com que a empresa retomasse o rumo e voltasse a avançar rumo à insurgência com escala.
Uma das grandes disfunções observadas na Norwegian durante o declínio foi que o pessoal de bordo dos navios não acreditava que o pessoal em terra fosse capaz de entender os desafios de seu trabalho, e vice-versa. Para Sheehan, conectar esses dois lados virou prioridade. Para garantir que um aprendesse com o outro, ele e a equipe começaram a incluir o pessoal dos navios em processos e decisões que até então transcorriam exclusivamente na matriz e a convidar oficiais de toda a frota para participar de reuniões externas da liderança da empresa.
Os líderes da empresa adotaram o sistema Kaizen (melhoramento contínuo) para buscar, na linha de frente, ideias para melhorar e otimizar operações e processos por toda a organização. Instituíram, ainda, extensos fóruns de discussão e reconhecimento para coletar as melhores ideias. Criaram até um forte método para envolver o pessoal nos detalhes do projeto de navios.
Insurgência viva. Xuanning [supermercados Yonghui] descreveu um permanente desafio: “Está ficando mais difícil crescer à medida que nosso setor fica mais saturado e mais competitivo”, disse. “Meu irmão e eu percebemos que devíamos seguir sendo os inovadores. Fizemos isso uma vez com o ‘formato das lojas vermelhas’ – como chamamos nosso modelo original de varejo. Mas precisamos fazer mais. Daí o formato das ‘lojas verdes’, que são nossas incubadoras de inovação. Se quiserem adotar uma inovação feita pelas ‘lojas verdes’, as ‘lojas vermelhas’ têm todo o direito. Só não podem inibir a inovação das lojas verdes, ainda que essa inovação venha a abalar as vendas das lojas vermelhas. É algo doloroso, mas que mantém nossa insurgência viva.”
Capítulo 4 – Reverta a estagnação
A certa altura do caminho, dois terços das empresas que crescem vão enfrentar a segunda crise previsível do crescimento: a desaceleração, ou estagnação. Para um líder, é um momento incrivelmente frustrante, pois nenhuma das fontes naturais de propulsão do passado parece produzir a velocidade e o impulso de antigamente.
De volta à mentalidade do fundador. Com a renúncia do controvertido Robert Nardelli em 2007, o conselho da The Home Depot instalou Frank Blake no posto de CEO. Blake imediatamente viu que teria de ir cuidar da experiência do cliente, que se encontrava muito deteriorada, e do desempoderado pessoal da linha de frente. Ambos os aspectos minaram as vantagens herdadas dos fundadores. Personalizar novamente a experiência na linha de frente para clientes e trabalhadores virou sua grande prioridade.
Desde o início, Blake difundiu em alto e bom som a mensagem de que a mentalidade dos fundadores estava de volta. No primeiro dia do cargo, o executivo se dirigiu a todos os funcionários pelo canal interno de TV da The Home Depot. Na ocasião, citou claramente um livro publicado pelos fundadores, Built from Scratch (Construído do Zero).
Muitas das primeiras iniciativas do novo CEO tinham como meta reempoderar a turma do avental laranja: o pessoal na linha de frente das lojas, que atendia o público. Por sugestão de Marcus, Blake passou a fazer visitas às lojas sem se identificar. Essas “missões secretas”, como chamou, foram tão úteis que Blake mandou todo alto executivo da equipe ir trabalhar periodicamente nas lojas, algo que a maioria nunca fizera.
Quando uma empresa encolhe para se reorganizar, remanejar recursos e crescer, é comum redescobrir o poder da insurgência original e assumir um compromisso renovado com essa missão. Foi o que ocorreu com a gestora de recursos Perpetual – a mais antiga da Austrália -, que, para renascer, promoveu um corte de 20% nos custos operacionais e abandonou atividades sem relação com o core. O resultado, disse um analista do setor, foi “a maior transformação na história da indústria de serviços financeiros australiana”.
A Perpetual foi fundada em 1886 para administrar o patrimônio de abastados australianos. Cumpriu tão bem a função, que rapidamente virou a maior empresa do gênero no país. Por mais de um século, foi a líder. Conforme ia crescendo, no entanto, a firma foi se diversificando, entrando em 11 novas áreas. Em 2011, perto do aniversário de 125 anos, estava em crise.
Depois de uma apuração inicial dos fatos, Geoff Lloyd [terceiro CEO da companhia] concluiu que, para salvar a Perpetual, teria de conduzir a empresa de volta à sua missão central, conforme definida mais de um século atrás por seus fundadores: proteger a riqueza da Austrália. Para atingir essa meta, viu que teria de tornar a empresa “mais rápida, mais confiante e, sobretudo, mais simples”.
Capítulo 5 – Como conter a queda livre
A queda livre em geral acomete incumbentes já maduras cujo modelo de negócios é alvo da artilharia de novas insurgentes ou se torna obsoleto devido a mudanças tecnológicas ou no mercado. No caso da Charles Schwab – cuja história usamos no segundo capítulo para ilustrar os problemas da queda livre -, os dois fatores tiveram um papel. Em 2004, a empresa convivia com uma enorme turbulência externa no mercado, novas concorrentes, uma queda de 50% no volume negociado, um recuo de 75% no valor de mercado e a reversão do Net Promoter Score, que do melhor do setor passara a ser o pior, com 34% mais detratores do que promotores entre os clientes.
Charles Goldman, o executivo que ficou a cargo da transformação da companhia, falou sobre sua impressão à época: “O Chuck [Charles Schwab] queria voltar a priorizar a experiência do cliente. Trocou mais da metade da equipe executiva já de largada. (…) Em seguida, fechou o foco em quatro áreas: renovar o valor para o cliente, melhorar sua experiência, fortalecer o balanço e escolher seu sucessor.” A principal providência foi estabilizar a empresa financeiramente, reduzindo custos para poder baixar os preços, e desovar ativos e negócios marginais para concentrar toda a energia em reparar o core business original.
Queda livre X stall-out. Dois fatores caracterizam a queda livre e ilustram como essa crise é distinta do stall-out. Primeiro, a queda livre é um momento de declínio rápido e assombroso do crescimento rentável e do valor de mercado. Foi o caso da Schwab, que perdeu 75% do valor. Segundo, a crise em geral é desencadeada por turbulências externas no mercado e a aparição de modelos de negócio novos, competitivos. É diferente do stall-out, quando o perigo ainda não é mortal e as causas, como a complexidade da empresa, tendem a ser predominantemente internas.
Uma premissa central deste livro é que a maioria dos problemas de desempenho vividos por uma empresa no mercado teria uma causa mais fundamental em seu interior. Ela é importante no caso da queda livre, pois a dinâmica no plano externo em geral é tão forte, que é fácil parar por aí. A queda livre na Nokia, por exemplo, pode ser atribuída a muitas forças externas, entre elas a estratégia competitiva da Apple, os problemas que a Nokia teve com o Symbion (seu sistema operacional para celular) ou o número reduzido de criadores de aplicativos para esse sistema. Mas a verdadeira razão da maioria dos problemas externos da empresa provou ser interna.
Capítulo 6 – Um plano de ação para liderar
Voltamos à nossa premissa inicial. Para vencer reiteradamente no plano externo, a empresa precisa estar configurada para vencer também no interno. E a melhor maneira de garantir que esteja é abraçar a mentalidade do fundador.
Essa é a função do líder, como tentamos deixar claro ao longo do livro. Quando falamos em “líder”, no entanto, não queremos dizer apenas o CEO, mas todo e qualquer líder da empresa. Imagine o poder de uma organização na qual líderes em todas as esferas abraçam a mentalidade do fundador. Uma empresa de insurgentes é uma coisa formidável. É o que Michael Dell tinha em mente quando, ao falar da renovação da Dell, declarou: “Quero criar as condições [para ter] a maior startup do mundo”.
Este livro está repleto de exemplos de empresas renovadas por líderes que enxergaram um potencial que seus antecessores não souberam aproveitar, e que usaram o poder da mentalidade do fundador para atingi-lo:
- Kent Thiry e equipe transformaram a DaVita de um negócio decadente e à beira da falência na empresa de melhor desempenho do setor de saúde nos EUA.
- Jorgen Vig Knudstorp conduziu o grupo LEGO de volta ao core, transformando a empresa com novas tecnologias e novas ideias e forjando, no processo, intimidade maior com o consumidor.
- Os investidores da NXP compraram uma empresa deixada à míngua pela dona anterior e promoveram uma recuperação radical, simplificando as operações.
- Movidos pela força de uma ideia, os fundadores da AB InBev transformaram uma cervejaria brasileira que não dava lucro em uma das grandes insurgentes em escala da atualidade.
- Steve Jobs, naturalmente, viu potencial na Apple quando ninguém mais via, e fez dela a empresa mais valiosa do mundo.
Ficha técnica:
Título: A mentalidade do fundador: A chave para sua empresa enfrentar as crises e continuar crescendo
Título original: The Founder’s Mentality
Primeira edição: Figurati
Resumo: Rogério H. Jönck
Edição: Monica Miglio Pedrosa
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