A sutil arte de ligar o f*da-se
Ideias centrais:
- O sofrimento é o agente preferido da natureza para provocar mudanças. A evolução nos faz viver constantemente com certo grau de insatisfação e insegurança, porque a criatura levemente insatisfeita luta para inovar e sobreviver.
- Com grandes poderes, vêm grandes responsabilidades: eis uma frase conhecida. Mas existe versão melhor. Basta trocar os substantivos de lugar: com grandes responsabilidades, vêm grandes poderes. Assumindo responsabilidades por nossa vida, temos mais poder para mudá-la.
- Em algum momento, temos medo de falhar, instintivamente evitamos inovar ou nos atemos a fazer aquilo em que somos muito bons. Isso é limitador. Se você se recusa a correr risco, não está disposto a ser bem-sucedido.
- Alguma coisa temos que rejeitar. Do contrário, não somos nada. Se uma coisa não for melhor ou mais desejável que outra, somos vazios e a nossa vida não tem sentido. Deixamos de ter valores e, portanto, vivemos sem propósito.
- Se não reconhecemos o olhar presente da morte, o superficial se torna importante e o importante, superficial. A morte é a nossa única certeza. Deve ser a bússola, pela qual orientamos nossos valores e decisões.
Sobre o autor:
Mark Mason se tornou notável blogueiro. A partir daí teve substrato mais que suficiente para construir um livro despretensioso e bem-humorado, fornecendo aos leitores conceitos e atitudes para uma vida melhor. Atualmente, mora em Nova York.
Capítulo 1 Nem tente
O capítulo começa com uma história de pouco sucesso, nada deslumbrante. O cara não estava nem aí para o sucesso. Seu nome era Charles Bukowski, alcoólatra, mulherengo, viciado em jogo, grosseirão e, em seus piores dias, um poeta. Bukowski trabalhava nos Correios. O salário, ridículo, era gasto quase tudo em bebida. O pouco que sobrava apostava em cavalos. Tentava vender poesias, contos literários, nada conseguia, mas num belo dia, um amigo se comove e tenta editar alguma coisa. E não é que o poeta que se arrastava teve sucesso? Tornou-se escritor profissional, vendendo no total mais de 2 milhões de exemplares. Todo mundo pensava, o cara está bem arrumado na vida. Qual nada. Não deu bola para o sucesso. Continuou a vida de boêmio. Sua história poderia personificar o Sonho Americano: o cara lutou, perseverou e venceu. Não foi essa versão que prevaleceu.
A obra de Bukowski não se sustenta na ideia de superar obstáculos nem de se empenhar para ser um gênio literário. É o oposto: seu sucesso vem da completa e inabalável honestidade consigo mesmo e da capacidade de falar abertamente de seus fracassos, sem hesitação ou dúvida. Na contramão do mito do sucesso.
A cultura em que vivemos hoje nutre obsessivamente expectativas pouco realistas. Ser mais feliz. Ser mais saudável, mais inteligente, mais rico, mais bonito.
O mundo não se cansa de indicar um caminho para a felicidade que se resume a mais e mais e mais: compre mais, tenha mais.
Ter necessidades demais faz mal para sua saúde mental. Você acaba se agarrando ao que é superficial e falso, dedicando a vida à meta de alcançar uma miragem de felicidade e satisfação. O segredo para uma vida melhor não é precisar de mais coisas, é se importar com menos, e apenas com o que é verdadeiro, imediato e importante.
Sendo assim, a pergunta é: com o que se importar? Como escolher o que importa? E como ligar o foda-se para todo o resto.
Capítulo 2 A felicidade é um problema
O capítulo começa com uma descrição do surgimento de Gautama, o Buda. Seu pai, rei do Nepal, evitava que o filho tivesse contato com a realidade fora do palácio. Assim, nada poderia afetar sua felicidade. Mas, num belo dia, o menino saiu furtivamente do palácio e se deparou com o sofrimento humano: viu doentes, velhos, desabrigados, mortes. Diante desse panorama, o filho passou a desprezar suas riquezas e fugiu do palácio.
Em outras palavras, o príncipe percebeu o que todo mundo já sabia: sofrer é uma merda, e não necessariamente se traduz em algo significativo. Seja na riqueza ou na pobreza, não existe valor no sofrimento quando não há um propósito. Daí foi um pulo para o príncipe chegar à conclusão de que sua ideia tão grandiosa, assim como a do pai, era uma bela bosta e de que deveria fazer outra coisa da vida. Esse príncipe, de nome Gautama, se tornaria conhecido como Buda. Ele criou um princípio central: devemos parar de tentar resistir à dor e à perda, pois são inevitáveis.
Existe uma premissa básica em muitas das nossas conjeturas e crenças. Ela postula que a felicidade é algorítmica, que pode ser buscada, merecida e alcançada, como se estivéssemos entrando na faculdade ou montando um complicado conjunto de Lego. Se eu conseguir X, serei feliz, se eu tiver a aparência Y, serei feliz.
Essa premissa é o problema. A felicidade não é uma equação que possa ser solucionada.
A insatisfação e a inquietude são inerentes à natureza humana e, como veremos, componentes necessários para se criar uma felicidade consistente. Eis a interpretação de Mark Mason: sofremos pelo simples fato de que sofrer é biologicamente útil. O sofrimento é o agente preferido da natureza para inspirar mudanças. A evolução nos faz viver constantemente com certo grau de insatisfação e insegurança, porque é a criatura levemente insatisfeita e insegura que faz o máximo para inovar e sobreviver. Somos programados pela natureza para ficar insatisfeitos com tudo que temos e desejar apenas o que não temos. Essa insatisfação permanente faz nossa espécie seguir lutando e progredindo, construindo e conquistando. Então, nossa dor e tristeza não são uma falha da condição humana. Pelo contrário: são um recurso essencial dela.
Assim como a dor física, a dor psicológica indica que há um desequilíbrio, que algum limite foi excedido. E, também como a dor física, a psicológica nem sempre é indesejável ou de todo ruim. Em certos casos, passar por dores emocionais ou psicológicas pode ser saudável ou mesmo necessário. Assim como bater o dedão nos treina para esbarrar menos em mesas, a dor emocional provocada por rejeição ou fracasso nos ensina a evitar os mesmos erros no futuro.
A felicidade está em resolver problemas. Repare que a palavra-chave é “resolver”. Se você evita os problemas ou acha que não tem nenhum, está no começo da infelicidade. Se acha que não consegue resolver seus problemas, estará no mesmo caminho. O segredo está em resolver os problemas e não em ter problemas.
Para ser feliz, é preciso ter algo para resolver. Assim, a felicidade é uma forma de ação; é uma atividade, não algo que você recebe de forma passiva, que descobre magicamente numa lista do Buzzfeed ou com algum guru. Ela não surge quando você finalmente ganha o suficiente para construir mais um cômodo na sua casa. Ela não está esperando por você em algum lugar, em alguma ideia, em um emprego… nem num livro.
Tomar decisões com base apenas no que seu coração manda, sem o auxílio da razão para se manter na linha, é pedir para dar merda. Sabe quem baseia a vida nas emoções? Crianças de três anos. Cachorros. Sabe o que mais as crianças de três anos e cachorros fazem? Cagam no tapete.
Capítulo 3 Você não é especial
Em algum momento da década de 1960, desenvolver uma “autoestima alta” – ter uma boa autoimagem e se sentir bem consigo mesmo – virou moda na psicologia. Pesquisas concluíram que as pessoas que se consideravam admiráveis tendiam a se sair melhor e ter menos problemas. Muitos estudiosos e legisladores da época acreditaram que aumentar a autoestima da população geraria benefícios sociais tangíveis; redução da criminalidade, melhora no desempenho acadêmico, geração de novos empregos, diminuição de déficits de orçamento.
Como resultado, a partir da década seguinte, de 1970, práticas relacionadas à autoestima começaram a ser ensinadas aos pais, reforçadas por terapeutas, políticos, e professores, além de serem instituídas na política educacional. Surgiram seminários empresariais e motivacionais, entoando o mesmo mantra paradoxal: cada um de nós pode ser excepcional e extremamente bem-sucedido.
Hoje, sabemos que adversidade e fracasso são muito úteis e até mesmo necessários para o desenvolvimento de adultos determinados e bem-sucedidos.
Sabemos que fazer as pessoas acreditarem que são excepcionais e se sentirem bem consigo mesmas sem fundamento não cria uma população de Bill Gates e Martin Luther Kings. Cria uma população de zumbis.
O problema com o movimento pró-autoestima é a crença de que podemos medir a autoestima pelos sentimentos positivos das pessoas em relação a si mesmas. No entanto, para se ter uma noção verdadeira e precisa do valor de um indivíduo é preciso avaliar como ele se sente em relação a seus aspectos negativos.
Gente arrogante exala autoconfiança em níveis irreais. Isso pode ser atraente para os outros, pelo menos por um tempo. Em alguns casos, a autoconfiança infundada é contagiante e ajuda as pessoas à sua volta a se sentirem mais confiantes também. O problema da arrogância é que as pessoas assim precisam se sentir bem consigo mesmas, o tempo todo, mesmo que à custa dos outros. E como é uma necessidade constante, as pessoas arrogantes acabam gastando a maior parte do tempo pensando no próprio umbigo.
Pessoas arrogantes têm apenas duas formas de ver os acontecimentos da vida, ambas relacionadas à sua grandeza: reafirmação ou ameaça. Se algo de bom acontece a elas, é fruto de algo incrível que fizeram. Se algo de ruim acontece, é porque alguém está com inveja, tentando derrubá-las. A arrogância é impenetrável. Pessoas desse tipo se convencem de qualquer coisa para alimentar sua sensação de superioridade. Mas a arrogância é uma estratégia falha. É mais uma forma de euforia. Não é felicidade.
Aquele que nutre uma boa autoestima verdadeira enxerga com honestidade – Sim, às vezes sou irresponsável com dinheiro. Sim, às vezes exagero meu próprio sucesso. Sim, sou muito dependente do auxílio dos outros – e age a fim de se aprimorar. O arrogante, porém, é incapaz de melhorar a própria vida, de forma duradoura e significativa, pois não reconhece os próprios problemas, aberta e honestamente.
Você não é especial. Geralmente, esta constatação – de que você e seus problemas não são mais graves ou mais dolorosos que os dos outros – é o primeiro passo, assim como o mais importante, para resolvê-los.
Capítulo 4 O valor do sofrimento
Em 1952, o governo japonês fez uma última tentativa de atrair os soldados remanescentes ainda escondidos pelos territórios do Pacífico. Dessa vez, cartas e fotos das famílias dos soldados desaparecidos foram espalhadas, junto com um bilhete escrito pelo próprio imperador. Mais uma vez, Hiroo Onoda se recusou a acreditar que a informação fosse real. Mais uma vez, julgou ser um truque dos americanos. Mais uma vez, ele e seus homens resistiram e continuaram a lutar.
Nessa época, um jovem chamado Norio Suzuki ouviu falar de Onoda. Suzuki era aventureiro, explorador, meio hippie. Era um espírito doidão e decidiu procurar Onoda em Lubang e adjacências, nas Filipinas. Suzuki perguntou a Onoda por que ele havia permanecido e continuado a lutar. Simples, respondeu Onoda: ele recebera a ordem de “jamais se render”. Por isso, ele ficou. Passara quase trinta anos simplesmente obedecendo a uma ordem. Então, Onoda perguntou a Suzuki por que um “garoto hippie” como ele foi procurá-lo. Suzuki explicou que tinha deixado o Japão em busca de três coisas: “O tenente Onoda, um panda e o Abominável Homem das Neves, nessa ordem.”
É comum que os seres humanos escolham dedicar grandes períodos de vida a causas aparentemente inúteis ou destrutivas. À primeira vista sem sentido. É difícil imaginar como Onoda pode ter sido feliz naquela ilha durante trinta anos – comendo insetos e roedores, dormindo na terra, assassinando civis, década após década. Ou por que Suzuki se jogou em direção à própria morte, sem dinheiro, sem companhia e com o único propósito de encontrar o fictício yeti [o homem das neves].
Hiroo Onoda voltou ao Japão em 1974, onde se tornou uma celebridade. Visitava programas de entrevistas na TV e estações de rádio; políticos faziam questão de apertar a sua mão; publicou um livro de memórias; o governo japonês lhe ofereceu bela soma em recompensa.
A maior ironia nisso tudo foi que Onoda ficou muito mais deprimido no Japão do que durante todos aqueles anos na floresta. Porque lá, ao menos, sua vida tinha um propósito, um sentido. Isso tornava o sofrimento tolerável e até um pouco prazeroso.
Mas, no novo Japão, que ele via como uma nação vazia, cheia de hippies e mulheres fáceis em roupas ocidentais, ele foi confrontado com a inevitável verdade: sua luta não valera nada. O Japão pelo qual ele vivera e lutara não existia mais. E o peso dessa percepção o atingiu como nenhuma bala jamais conseguira. Como seu sofrimento não significara nada, a conclusão se tornou clara e real: trinta anos desperdiçados. Em 1980, Onoda fez as malas e foi para o Brasil, onde morou praticamente até morrer.
Os valores são a base de tudo que somos e fazemos.
Se o que valorizamos é inútil, se o que escolhemos considerar sucesso ou fracasso é equivocado, qualquer coisa baseada nesses valores – pensamentos, emoções, sentimentos cotidianos – será equivocada também. No final das contas, tudo que pensamos e sentimos sobre uma situação se resume ao valor que damos a ela.
Capítulo 5 Você está sempre fazendo escolhas
Certa noite, enquanto lia um livro de Charles Peirce, William James [pioneiro americano em psicologia] decidiu fazer um pequeno experimento. No diário, escreveu que passaria um ano acreditando ser cem por cento responsável por tudo que ocorria em sua vida, fosse o que fosse. Durante este período, ele faria tudo que estivesse ao alcance para mudar sua situação, mesmo que as chances de dar certo fossem nulas. Se nada melhorasse naquele ano, ficaria claro que ele realmente era impotente diante das circunstâncias da vida e, diante disso, William James se mataria.
O resultado? William James se tornou o pai da psicologia norte-americana. Sua obra foi traduzida para uma cacetada de idiomas e ele é considerado um dos intelectuais/filósofos/psicólogos mais influentes de sua geração. Posteriormente, ele se tornou professor de Harvard e cruzou os Estados Unidos e Europa dando palestras. Casou-se e teve cinco filhos (um dos quais, Henry, que foi um famoso biógrafo e ganhou o prêmio Pulitzer).
Nem sempre dá para controlar o que acontece conosco, mas sempre podemos definir nossa interpretação dos acontecimentos e nossa reação a eles.
Tendo ou não essa consciência, sempre somos responsáveis pelo caminho que tomamos. É impossível não ser. Não interpretar conscientemente os acontecimentos já é uma interpretação. Mesmo que você seja atropelado por uma carrocinha de pipoca e um monte de crianças ria da sua cara, ainda é sua responsabilidade interpretar o significado disso e escolher como reagir.
Gostemos disso ou não, estamos sempre assumindo um papel ativo no que acontece conosco e dentro de nós. Estamos sempre atribuindo significados a momentos e eventos. Sempre escolhemos ou reafirmamos os valores que norteiam nossos atos e os parâmetros, segundo os quais avaliamos tudo o que nos acontece. Muitas das circunstâncias dependem unicamente do parâmetro de avaliação, não sendo intrinsecamente boas ou ruins.
“Com grandes poderes, vêm grandes responsabilidades”, eis uma frase muito repetida, principalmente depois de sete cervejas. É verdade. Mas existe uma versão melhor dessa frase, uma que é realmente profunda. Basta trocar os substantivos de lugar: com grandes responsabilidades, vêm grandes poderes. À medida que assumimos responsabilidade por nossa vida, mais poder adquirimos para mudá-la. Assim, aceitar-se responsável é o primeiro passo para resolver os seus problemas.
Capítulo 6 Você está errado em tudo (eu também)
Crescimento pessoal é um processo infinitamente repetitivo. Quando aprendemos algo novo, não passamos de “errados” a “certos” – passamos de “errados” a “um pouco menos errados”. E quando aprendemos algo adicional, passamos de um pouco menos errados a um pouco menos errados do que antes e, em seguida, a menos errados ainda, e assim por diante. Aproximar-se da verdade e da perfeição não leva à verdade nem à perfeição.
Não devemos procurar a resposta “certa” e sim tentar eliminar nossos erros de hoje para estarmos um pouco menos errados amanhã.
Não há dogma correto nem ideologia perfeita. Existe apenas o que a sua experiência demonstrou ser certo para você – mesmo assim, provavelmente essa experiência também está meio errada. Uma vez que você, eu e todo mundo temos necessidades, histórias pessoais e situações de vida diferentes, inevitavelmente chegamos a respostas “corretas” diferentes sobre o significado da vida e sobre como devemos viver.
Porque eis algo estranho, mas verdadeiro: não sabemos a diferença entre uma experiência positiva e uma negativa. Alguns dos momentos mais difíceis e estressantes da nossa vida acabam sendo também os que mais nos motivam e auxiliam em nossa formação. Algumas das melhores e mais gratificantes experiências são também as que mais nos distraem e desmotivam. Não confie na sua concepção de experiências positivas ou negativas. Só sabemos o que dói e o que não no momento, e isso não vale nada. Muitos dos nossos valores, a maioria deles, são produto de eventos que não representam o mundo como um todo ou de um passado deturpado pela memória.
O resultado? Grande parte das nossas crenças é incorreta. Ou, para ser mais exato, todas são – algumas apenas são menos que outras. A mente humana é um amontoado de inexatidões. E, apesar de isso ser um conceito desconfortável, aceitá-lo é muito importante.
Não só nossa memória é uma droga – a ponto de testemunhos oculares não serem necessariamente levados a sério num julgamento -, como nosso cérebro tem um funcionamento nada imparcial. Como? Bem, ele está sempre tentando analisar nossa situação atual com base no que já acreditamos e já vivemos.
Toda informação nova é avaliada segundo padrões e conclusões prévios. O resultado é um cérebro sempre tendencioso em relação ao que consideramos ser verdade em determinado momento.
A incerteza neutraliza os julgamentos que fazemos dos outros; previne os estereótipos que fazemos dos outros quando vemos alguém na TV, no trabalho ou na rua. Ela também nos livra do autojulgamento. Porque não sabemos se somos agradáveis aos olhos alheios, se somos atraentes, se temos potencial para o sucesso. A única maneira de alcançar esses objetivos é permanecer em dúvida quanto a eles e estar aberto para descobrir a verdade através da experiência. A incerteza é a raiz de todo progresso e de todo crescimento. Como diz um velho ditado, o homem que acha que sabe tudo não aprende nada. É impossível aprender algo, a não ser, partindo da ignorância.
Capítulo 7 Fracassar é seguir em frente
O fracasso em si é um conceito relativo. Se meu parâmetro para a definição de sucesso fosse “me tornar um revolucionário anarco-comunista”, minha incapacidade absoluta de ganhar dinheiro nos anos de 2007 e 2008 teria significado sucesso total. Mas, se, como as pessoas normais, meu parâmetro fosse apenas um primeiro emprego decente para pagar algumas contas depois de formado, eu fui um fracasso.
Aprimorar-se numa tarefa é um processo que passa por milhares de pequenos fracassos, e a magnitude do seu êxito nisso vai se basear em quantas vezes você não conseguiu fazer determinada coisa. Se alguém é melhor do que você em algo, é provável que tenha cometido mais erros. Se alguém não é tão bom quanto você, é provável que não tenha enfrentado todas as dolorosas experiências de aprendizagem.
Em algum momento, acabamos com medo de falhar, instintivamente evitando inovar ou só fazer aquilo em que somos muito bons. Isso é limitador e sufocante.
Só podemos atingir a excelência em algo se estivermos dispostos a falhar. Se você se recusa a correr o risco, não está disposto a ser bem-sucedido. Grande parte do medo do fracasso surge por conta de valores pessoais muito ruins. Por exemplo, se eu avaliar a mim mesmo pelo parâmetro “ser amado por todo mundo”, a ansiedade é certa, uma vez que dependerei cem por cento dos outros. Não estarei no controle. Assim, meu valor estará à mercê do julgamento de terceiros.
O princípio do Faça Alguma Coisa não apenas ajuda a superar a procrastinação como contribui para a incorporação de novos valores. Se está no meio de uma tempestade existencial e nada faz sentido – se todos os seus mecanismos de autoavaliação o deixaram na mão e você não sabe o que esperar, se sabe que tem feito mal a si mesmo perseguindo falsos sonhos ou que sua autoavaliação poderia alcançar um parâmetro melhor que você desconhece – a resposta é a mesma: faça alguma coisa.
Capítulo 8 A importância de dizer não
A liberdade nos dá a oportunidade de encontrar um significado maior, mas ela em si não tem necessariamente nada de significativo. No fim das contas, a única maneira de encontrar significado e propósito é rejeitar alternativas, num processo que constitui um estreitamento da liberdade, ao escolher formar vínculos e assumir compromissos com um lugar, uma crença ou uma pessoa.
Essa percepção, diz Mason, me ocorreu lentamente, durante meus anos de viagem. Como acontece com a maioria dos excessos que cometemos, é preciso se afogar neles para perceber que não fazem você feliz. Enquanto eu me afogava no quinquagésimo quinto país, comecei a entender que, de todas aquelas experiências empolgantes e incríveis, poucas teriam algum significado duradouro.
Dentre essas viagens uma foi à Rússia, a São Petersburgo. A cultura russa, segundo o autor, tem uma aspereza que costuma desagradar os ocidentais. Ficam para trás as falsas simpatias e as cortesias verbais. Ninguém ali sorri para desconhecidos nem finge gostar de alguma coisa por educação.
“Após anos de viagem, foi ali, no lugar menos americano de todos, que conheci uma liberdade nova: poder dizer o que eu pensava e sentia, sem medo de repercussão. Aceitar a rejeição era uma estranha forma de educação… o mês que passei em São Petersburgo passou voando e, no final, eu não queria ir embora”, relata Mason.
Viajar é uma ferramenta fantástica de desenvolvimento pessoal, porque nos afasta dos valores da nossa cultura e demonstra que outra sociedade pode viver com valores diferentes e ainda funcionar sem se odiar. Essa exposição a valores e parâmetros diferentes nos faz reexaminar o que parece óbvio e considerar que nossa forma de viver pode não ser necessariamente a melhor. Nesse caso, a Rússia fez Mason reexaminar a falsa comunicação calcada em simpatia, tão comum na cultura ocidental.
Como extensão da nossa cultura positivista/consumista, muitas pessoas foram “doutrinadas” na crença de que devem concordar e aceitar o máximo possível. Este é um dos pilares de muitos livros que pregam o pensamento positivo: abra-se para as oportunidades, aceite, diga sim a tudo e a todos, e por aí vai.
Mas alguma coisa a gente tem que rejeitar. Do contrário, não somos nada.
Se uma coisa não for melhor ou mais desejável do que outra, somos vazios e a nossa vida não tem sentido. Deixamos de ter valores e, portanto, vivemos sem propósito. Evitar rejeitar e ser rejeitado é uma ideia vendida como maneira de se sentir melhor. Evitar a rejeição proporciona um prazer breve, mas nos deixa desorientados por um bom tempo.
Capítulo 9 … E aí você morre
A morte assusta. É por isso que evitamos pensar nela, falar nela, às vezes até reconhecê-la, mesmo quando acontece com alguém próximo. Só que, de uma maneira bizarra e invertida, a morte é a luz pela qual a sombra de todo o significado da vida é mensurada. Sem a morte, nada teria importância, todas as experiências seriam arbitrárias, todas as medidas e todos os valores seriam reduzidos a zero num instante.
Ernest Becker era um acadêmico marginalizado. Em 1960, obteve seu Ph.D em antropologia, sua tese de doutorado comparou as práticas estranhas e pouco convencionais do zen-budismo e da psicanálise. Becker teve uma vida acadêmica agitada passando por várias universidades, não se fixando em nenhuma. Antes de morrer, escreveu A negação da Morte, que ganhou o prêmio Pulitzer.
O argumento de Becker é o seguinte: todos sabemos que o eu físico vai acabar morrendo e que a morte é inevitável, e essa inevitabilidade – em algum nível inconsciente – nos mata de medo. Portanto, para compensar o medo da inevitável perda do eu físico, tentamos construir um eu conceitual, que viverá para sempre. É por isso que as pessoas se esforçam tanto para colocar seu nome em prédios, estátuas e lombadas de livros. É por isso que nos sentimos impelidos a dedicar tanto tempo aos outros, especialmente às crianças, na esperança de que a nossa influência – nosso eu conceitual – dure mais que o físico.
Becker chamou esses esforços de nossos “projetos de imortalidade”, aqueles que permitem que o eu conceitual continue vivo muito tempo depois da nossa morte física. Toda a civilização humana, diz Becker, é basicamente o resultado de inúmeros projetos de imortalidade: cidades, governos, estruturas, autoridades etc. Essas teses tiveram bastante repercussão e daí para o Pulitzer foi um pulo.
Se não reconhecemos o olhar sempre presente da morte, o superficial parece importante, e o importante superficial. A morte é nossa única certeza. Portanto, deve ser a bússola pela qual orientamos todos os nossos valores e decisões. A morte é a resposta certa para todas as perguntas que devemos fazer, mas nunca fazemos.
Texto: Rogério H. Jönck
Imagens: Reprodução e Unsplash
Ficha técnica:
Título: A sutil arte de ligar o f*da-se
Título original: The Subtle Art of Not Giving a Fuck
Autor: Mark Mason
Primeira edição: Editora Intrínseca (novembro de 2017)
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