Ataques hacker inflacionam salários em segurança da informação
Raphael Carriço, gerente da divisão de tecnologia da informação da Michael Page, diz que segmento de segurança da informação é líder em vagas, mas tem poucos profissionais qualificados
A crescente exposição de empresas em uma sociedade cada vez mais digitalizada trouxe uma realidade desafiadora: as ameaças à segurança da informação, como uma invasão hacker. Casos como os ataques à plataforma ConectSUS, Lojas Renner e Grupo Fleury, entre tantos outros, são exemplos de que brechas nos sistemas podem custar muito caro.
Números da empresa de segurança Fortinet, indicam que o Brasil sofreu mais de 3,2 bilhões de tentativas de ataques cibernéticos somente no primeiro trimestre de 2021. O país é líder desta listagem na América Latina. Os riscos de ataques também entraram no radar das empresas com o home office durante a pandemia. Afinal, acessos tiveram que ser concedidos fora dos ambientes das empresas, realidade que exigiu robustez dos processos de autenticação. Um estudo de Índice de Gerenciamento de Acesso de 2021, da Thales, levantou que 90% dos executivos brasileiros entrevistados estão preocupados com os riscos de segurança a partir do home office.
Diante desse cenário, a busca por executivos e profissionais especializados em segurança da informação disparou, inflacionando o mercado. A razão é que, apesar das inúmeras oportunidades, a área sofre com a escassez de mão de obra, assim como praticamente todo o mercado de tecnologia.
“A gente, infelizmente, ainda tem uma escassez de mão de obra qualificada muito grande no mercado. Ou seja, eu enxergo isso como uma super oportunidade. Então, a gente está falando de um mercado que é líder em vagas, líder em oportunidades e projetos, onde eu tenho uma baixa de profissionais qualificados”, afirma Raphael Carriço, gerente da divisão de tecnologia da informação da Michael Page.
“Eu fiz uma pesquisa no Linkedin, que é um dos nossos principais parceiros, nosso grande motor de busca, e, no mês de novembro de 2021, foram abertas mais de mil vagas de segurança da informação no Brasil. É um mercado que está inflacionado já de largada. Talvez seja o mercado que remunera melhor, junto com o mercado dos desenvolvedores”, disse Carriço, que atua na área de recrutamento de profissionais de tecnologia.
Veja a seguir os principais trechos da entrevista.
1 – Alto volume de oportunidades
“Estamos passando por um momento, no mercado de tecnologia, bastante atípico dos últimos anos. Durante a pandemia, a tecnologia se tornou uma área estratégica de quase todos os negócios. Deixou de ser um centro de custo. Trazendo isso para o mundo de recrutamento e seleção, nunca se viu um volume tão grande de oportunidades em aberto. E a gente ainda tem uma escassez de mão de obra qualificada muito grande no mercado. Ou seja, é um mar aberto e pouco desbravado ainda para quem quer fazer uma escalada de carreira”.
2 – Salários inflacionados
“Números do BNE, o Banco Nacional de Empresas, mostram que, em 2019, foram abertas mais de 8 mil vagas de tecnologia no Brasil. Nesse mesmo período, em 2020, foram abertas 12.680 vagas, o que equivale a mais ou menos 63% de aumento. Em remuneração, a gente tem uma inflação acumulada, em 2021, para a grande maioria dos casos, que chega a quase 20%. São dados da Computerworld. A gente tem uma previsibilidade, com apoio do Sindpd (Sindicado dos Trabalhadores em Processamento de Dados e Tecnologia da Informação do Estadod e São Paulo), o principal sindicato de tecnologia. Até 2024, o mercado deve abrir mais de 70 mil vagas em tecnologia. Então, se hoje a gente tem uma média de 12 mil, 13 mil vagas em aberto, daqui a dez anos podemos chegar a 70 mil vagas. É o mercado que mais vai alavancar oportunidades”.
3 – Remuneração em alta
“Eu fiz uma pesquisa no Linkedin, que é nosso grande motor de busca, e, em novembro de 2021, foram abertas mais de mil vagas em segurança da informação no Brasil. É um mercado que está inflacionado já de largada. Talvez seja o mercado que remunera melhor, junto com o de desenvolvedores. Então, pensando que existem três classes de empresas – pequenas, médias e grandes -, a gente fez uma média dos salários. Você pode começar a carreira como especialista em segurança da informação, com pouca experiência, e já com remuneração de R$ 5 mil e chegar a R$ 10 mil. Salários de especialistas, estamos falando de arquitetos, engenheiros de segurança, white hackers, vão de R$ 12 mil a R$ 20 mil; gerentes e líderes, de R$ 20 mil a R$ 35 mil; e CISO, os C-levels, a partir de R$ 35 mil, R$ 40 mil”.
4 – Recorde de vagas
“Em 2020, o começo da pandemia foi um momento de bastante angústia e incerteza. Empresas que tinham cultura 100% de escritório, tiveram que se adaptar ao home office. A gente viu o mercado de varejo crescendo bastante, porque as pessoas tinham que se adaptar em casa. Depois a gente viu o mercado de consumo, o mercado de e-commerce e grandes atacados digitalizando. Mas acredito que, no final de 2020 para começo de 2021, o mercado entendeu que isso poderia ser uma oportunidade. A gente começou com um cenário avassalador em termos de oportunidade. Para se ter uma ideia, em outubro, nós batemos o recorde de número de vagas fechadas e faturamento em tecnologia, que nós não tínhamos desde 2011”.
5 – Executivos com olhar 360 graus
“Para a fatia mais estratégica e tática da pirâmide corporativa, o que a gente mais viu foram empresas muito preocupadas em trazer para o time profissionais atualizados. O grande volume de dados, a questão dos produtos na nuvem, da infraestrutura, a grande volumetria de dados com que a gente vem trabalhando ultimamente, atrelada à digitalização dos negócios, fez com que as empresas passem a olhar para executivos um pouco mais 360°. Executivos que consigam contribuir não somente com a tecnologia como um negócio, mas que também participem da transformação digital. É um conceito que as empresas precisam adotar na política do dia a dia, com os funcionários, mas que conta muito forte para a percepção de um bom executivo em tecnologia. Não são grandes os volumes de vagas de executivos em tecnologia. O que a gente vê são reposições.”
6 – Comunicação ainda é um gap
“Comunicação com o mundo da tecnologia ainda é um grande gap (lacuna). Mesmo olhando para os executivos, a gente fala de maneira muito técnica. É diferente a oratória de um CTO da oratória de um CFO ou de um CEO. Isso já tem mudado bastante, mas a comunicação ainda é um destaque positivo. Atrelado à comunicação, o idioma deixou de ser um diferencial e passou a ser mandatório em todos os pré-requisitos. A gente tem visto um movimento cada vez mais forte de negócios globalizados, de empresas investindo no Brasil, de novos negócios chegando aqui, de investidores de outros países. Comunicar-se em outra língua deixou de ser um diferencial e passou a ser algo mandatório. Infelizmente, no Brasil apenas 3% da população fala inglês fluente.”
7 – Mercado aberto a todos
“Segurança da informação é uma oportunidade para todo mundo. Porque a gente tem um mercado escasso de mão de obra qualificada e, quando traz isso para segurança da informação, é menor ainda. Ainda é uma comunidade muito pequena. Eu faço poucas vagas de segurança da informação. Mas sei que todo mundo está preocupado com isso. Principalmente, depois de agosto de 2018, quando entrou a LGPD. A gente fala de segurança da informação em alguns pilares. Tem a segurança corporativa, onde os profissionais olham mais as questões de auditoria e de governança. Tem desenvolvimento e segurança forense, que já é a questão mais técnica, de teste de penetração, de vulnerabilidade. E tem o profissional que não quer ser tão técnico, mas gosta de teorias, métodos, conceitos e processos. Ou, ainda, aquele que vai ‘escovar bit’, como a gente fala, que é o mais técnico possível. Então, sim, para o mercado que está carente de mão de obra qualificada, não importa se você tem 18 ou 60 anos. Se você tiver qualificação adequada, vai entrar no projeto.”
8 – Diversidade e inclusão social na tecnologia
“Eu brinco que a cada dez clientes que eu visito, onze me pedem perfil de mulheres. É uma unanimidade. A igualdade entre as pessoas dentro do negócio é um ponto super positivo e é uma boa oportunidade para as mulheres. Até porque, a gente tem excelentes mulheres à frente de boards de grandes empresas de tecnologia. A Cristina Palmaka, da SAP; Tania Cosentino, head da Microsoft… Cada vez mais, o mercado tem valorizado essa procura. As mulheres vêm com uma visão multitarefa muito grande, uma visão organizacional muito avançada, uma maturidade de negócios, uma maturidade de pessoas. Infelizmente, quanto mais técnica é a área, a gente ainda tem um público masculino muito maior. É uma lacuna para gente”.
9 – Investimentos em soluções de segurança
“O IDC (Internacional Data Corporation) tem um dado que revela que, em 2021, investimentos e gastos com soluções de segurança da informação no Brasil já ultrapassam US$ 900 milhões, uma alta de 12,5% em relação a 2019. Esse crescimento inicial de investimentos em tecnologia gera negócios, oportunidades e vagas no mercado. Não posso falar por outros países, mas vejo isso como um movimento mundial. Acontece que alguns países de primeiro mundo já têm esse conceito mais à frente. No Canadá, por exemplo, existe um investimento muito grande em intercâmbio de profissionais de tecnologia, porque lá eles também têm esse problema. Já nos Estados Unidos é menor, assim como no México. Na Índia e na China, nem se fala. No Brasil, existem três principais pólos que investem em tecnologia: São Paulo; o Porto Digital, no Recife, e o Parque de Software no Sul (em Curitiba). São regiões que têm incentivo fiscal para empresas de tecnologia aportarem. Aí, naturalmente, isso cresce também com mão de obra e oportunidades”.
10 – Segurança da informação nas empresas
“As empresas estão cada vez mais investindo em treinamento sobre segurança da informação, phishing (enganar as pessoas para que compartilhem informações confidenciais), engenharia social. É comum agora eu conversar com amigos que trabalham em empresas de outro setor, de bancos, e eles falarem: ‘nossa chegou um e-mail aqui super atrativo, quando eu fui abrir, era um arquivo pdf, eu não abri’. As empresas também estão fazendo teste de phishing com os funcionários para entender a aplicabilidade dos treinamentos que estão dando. A mobilidade aumentou a relevância da integridade dos dados das empresas. Aumentou também a produtividade. As empresas faturaram mais, escalaram os negócios. Mas, com isso, também tem toda essa responsabilidade. Como mantenho a integridade dos meus dados? Não somente com ferramental técnico, mas de uma forma consciente, com os colaboradores?”
Texto: Ana Letícia da Rosa
Foto: Max Duzij / Unsplash
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