Transição verde e avanço tecnológico dominarão o trabalho do futuro

Monica Miglio Pedrosa
A transição verde como fator de transformação do futuro do trabalho foi o foco principal da apresentação de Gui Brammer, conselheiro do Fórum Econômico Mundial, na palestra de abertura do RH Experience, evento exclusivo do Experience Club que recebeu um grupo de 80 líderes de grandes empresas na sexta, 9 de maio, na Experience House, em São Paulo. Fundador da empresa de economia circular Boomera, vendida em 2023 para o Grupo Ambipar, Gui trouxe reflexões sobre os desafios e oportunidades que surgem no novo cenário global do trabalho.
Os resultados apresentados vieram da pesquisa anual feita pelo Fórum Econômico Mundial e divulgada no início de 2025. O estudo ouviu mil líderes globais, de 55 países e 22 indústrias, cujas empresas representam 14 milhões de trabalhadores. O Future of Jobs Report 2025 estima que 170 milhões de novos empregos devem surgir até 2030, enquanto 92 milhões de funções atuais tendem a desaparecer, devido a cinco fatores principais: mudança tecnológica, fragmentação geoeconômica, mudanças demográficas, transição verde e incertezas econômicas.
Para dar conta das novas profissões que surgirão, 39% das habilidades profissionais precisarão ser adequadas. Se, em 2025, as cinco principais competências eram predominantemente humanas — pensamento analítico; resiliência, flexibilidade e agilidade; liderança e influência social; pensamento criativo; e motivação e autoconhecimento — em 2030, três das cinco estarão diretamente relacionadas ao avanço tecnológico: inteligência artificial e big data; cibersegurança e redes; literacia tecnológica; além do pensamento criativo e da resiliência.
O relatório também revela que 86% dos entrevistados acreditam que tecnologias como inteligência artificial, big data, realidade virtual e aumentada transformarão os ambientes de trabalho, seguidas pelos sistemas autônomos e robôs (58%). Para Gui, porém, não se trata de um cenário apocalíptico de “robôs versus humanos”, mas de uma relação simbiótica em que as máquinas assumem funções repetitivas e automáticas e os humanos a criatividade, o pensamento crítico e a resolução de problemas complexos. Aprender a trabalhar com as novas tecnologias será vital para navegar nesse novo contexto, e a reciclagem e o desenvolvimento de competências serão críticos neste processo, algo reconhecido por 77% dos entrevistados.
Economia Circular é vital para os esforços de descabornização
Não é novidade que a forma como consumimos recursos naturais e produzimos resíduos está levando o planeta a um ponto de esgotamento. No modelo econômico atual (economia linear), extraímos matérias-primas que levaram milhões de anos para se formar, transformamos esses recursos em produtos com ciclos de vida cada vez mais curtos, usamos por poucos dias, horas ou até minutos e, em seguida, descartamos. Esse processo gera impactos ambientais insustentáveis, com desperdício de materiais, poluição, emissão de carbono e esgotamento de ecossistemas inteiros.

Enquanto energias renováveis e eficiência energética podem resolver cerca de 55% das emissões globais, estratégias de economia circular são necessárias para lidar com os 45% restantes. Gui apontou ainda que a indústria é responsável por 27% das emissões globais de carbono, e que o aço, cimento, alumínio e produtos químicos respondem por 60% desse total.
A alternativa está na economia circular, um modelo que propõe prolongar o ciclo de vida dos produtos e reaproveitar recursos, reduzindo ao máximo a necessidade de extração de novas matérias-primas. Isso exige repensar toda a cadeia de produção, aplicando inovação para redesenhar processos, embalagens e, principalmente, comportamentos de consumo. “Problemas sociais e ambientais impactam 30% do supply chain no mundo”, alertou Gui.
Entre os exemplos de inovação na transição para a economia circular estão modelos baseados em serviços e na economia compartilhada. Alguns casos citados por ele incluem o aluguel de filtro de água, em vez da venda, para prolongar a vida útil do produto; o aluguel de turbinas de avião por milhas voadas; a venda de ambientes iluminados, em vez de lâmpadas; e até mesmo o Uber, que utiliza carros que estavam antes ociosos para atender mais pessoas.
“O mesmo ser humano que inventou o problema também pode inventar a solução”, afirmou Gui, destacando que as empresas sociais, que têm como foco principal a geração de impacto positivo, podem ser grandes aliadas nesse processo. Em 2024, existiam 10 milhões dessas empresas, que geraram 200 milhões de empregos e movimentaram 2 trilhões de dólares em receita anual.
O empreendedor social é, frequentemente, alguém que sofre diretamente o impacto do problema e cria soluções para ele. “São histórias maravilhosas, como a de uma empresa social na Nigéria, que criou uma franquia de banheiros químicos para combater a falta de saneamento nas favelas”, exemplificou. As empresas tradicionais podem apoiar esses negócios sociais com tecnologia, ferramentas e investimento.
Diversidade como motor para a inovação
Gui também abordou os impactos das tensões geopolíticas globais, especialmente as decisões do governo Trump, que vêm provocando o que ele chama de globalização reversa. “Isso exigirá mudanças operacionais importantes, como ajustes logísticos e a capacidade de adaptar os sistemas internos das organizações, incluindo um olhar mais estratégico para o mercado doméstico”, afirmou.
A discussão trazida pelo embate com o movimento Woke — que defende os direitos de grupos marginalizados e maior consciência social — levou Gui a provocar: “Estamos falando de Woke ou de diversidade? A diversidade é um fator de vantagem para as empresas, é essencial para quem quer inovar”, afirmou. Ele reforçou que reunir pessoas com vivências e trajetórias semelhantes em uma mesma sala dificilmente resultará em inovação. “No MIT Media LAB, uma iniciativa para discutir o câncer de pâncreas reuniu médicos, teólogos, psicólogos, professores, publicitários. Porque eles entendem que a visão diversa é necessária para resolver problemas complexos. E as máquinas não conseguirão fazer isso sozinhas.”
Para concluir, Gui deixou um recado sobre como se preparar para o futuro do trabalho: “É preciso ser cada vez mais curioso, nunca parar de estudar e se colocar de uma nova maneira diante das mudanças que estão chegando, com menos certezas e mais perguntas.”
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