“Empresas estão só começando a olhar para a economia prateada, mercado de R$ 2 trilhões”
Por Denize Bacoccina
A divulgação do Censo de 2022, no fim do ano passado, foi um susto para muita gente. O Brasil tinha, definitivamente, se tornado um país de velhos. Uma afirmação que assusta, porque à primeira vista parece uma coisa negativa. Mas isso aconteceu por um bom motivo: estamos vivendo mais e nossa taxa de natalidade já é similar à de países desenvolvidos. O que falta, ainda, é que a sociedade, o poder público e as empresas percebam as adaptações que são necessárias para atender a esse novo perfil demográfico brasileiro. Tanto em termos de ofertas de serviços público quanto de oportunidades de mercado.
Entre o censo de 2010 e o de 2022, a parcela da população com mais de 60 anos passou de 10,8% para 15,6%, enquanto a fatia dos menores de 14 anos caiu de 24,1% para 19,8% do total no mesmo período.
Andrea Bisker, fundadora e CEO da Spark:off, especializada em ciências do consumo e em future thinking, vem se dedicando a estudar o potencial deste mercado, a chamada economia prateada, que no Brasil movimenta R$ 2 trilhões ao ano. Andrea falou nesta entrevista à [EXP] sobre esse novo perfil demográfico brasileiro e as oportunidades desse mercado e fez uma palestra sobre o tema no RH Experience, no fim de 2023 (veja abaixo).
[EXP] – Andrea, a economia prateada movimenta R$ 2 trilhões no Brasil. As empresas estão olhando pra isso, estão sabendo se comunicar com esse público, estão preparadas para aproveitar essa oportunidade de mercado?
Andrea Bisker – Estão a mil agora. Eu percebo isso pelo volume de solicitações para falar desse assunto. Saiu recentemente uma pesquisa que foi liderada pela Rita Almeida e outra grande agência de pesquisa também está mapeando esse mercado.
Então, sim, mas não sei se são todas as indústrias. Uma indústria que está muito de olho é a da beleza. Também o mercado de real state. A Loft colocou na publicidade uma pessoa mais madura. As empresas estão abrindo espaço para as pessoas trabalharem. Elas querem entender melhor o seu público, como Livelo, Credicard. Acho que acendeu uma luz.
Esse mercado já está sendo olhado como mercado consumidor?
Está começando a ser olhado pelas empresas como mercado consumidor potencial. E o censo só comprovou isso. Mostrou esse aumento das pessoas mais maduras. Em muito pouco tempo o Brasil vai ser o quinto país do mundo com população mais velha. Eu acho que as empresas estão prestando atenção, a gente começa a ver novas narrativas. Antes, era uma coisa isolada. Agora todo mundo quer falar com esse público.
Estamos falando como consumidor. E a pessoa mais velha como profissional? Como está a inserção nas empresas?
Quem trabalha diretamente com isso é o Morris da Maturi, que trouxe o Age Friendly, um selo que certifica que a empresa tem uma política favorável às pessoas mais velhas. É um assunto que está começando a reverberar. A pesquisa Tsunami 60+ mostra que três em cada cinco pessoas já sofreram algum tipo de preconceito: ele é muito velho, ele é muito lento, ele não vai saber mexer. Mais de 50% se sentem completamente descartados do mercado. O preconceito ainda é muito grande e uma das coisas que as pesquisas mostram é que os líderes não estão dando muita importância para esse assunto. Eles são justamente as pessoas que têm 50, 60 anos.
Ou seja, mesmo essas pessoas que têm mais de 50 acham que suas equipes têm que ser mais jovens.
E a pesquisa também mostra que quando você pergunta sobre diversidade, inclusão, o etarismo nem aparece como assunto. Tem lá primeiro as mulheres, depois raça, LGBTQIA+, pessoas com neurodivergência, com deficiência. A idade nem aparece.
Qual a importância de incluir a diversidade geracional nas empresas?
Acho que tem dois lados. Primeiro, como sociedade. Se a gente não encontrar formas de dar emprego para essas pessoas, a nossa sociedade não vai se sustentar no longo prazo. E o outro é a sabedoria. Se formos olhar todos os power skills que estamos buscando, são os que os mais velhos têm. O pensamento analítico, a tranquilidade para tomar decisões. Eu acho que você consegue equilibrar mais as empresas quando você tem essa troca de conhecimento. Pessoas mais maduras, que sabem lidar com mais calma com as coisas, que sabem resolver problemas porque já têm uma experiência muito grande.
Eu não sei se é miopia a minha, porque eu estou nos meus 56 anos e me sinto como se tivesse 36. Não sinto nenhum preconceito, mas eu tenho a minha empresa e acho que as pessoas valorizam a experiência, o fato de ser uma palestrante. Mas, nas empresas, vejo poucas pessoas acima de 50 anos. Não é um assunto prioritário hoje, mas eu acho que o censo de 2023 foi um choque pra todo mundo.
O mais importante de tudo é o preconceito. As pessoas que têm 40 e poucos anos não pensam que daqui a dez anos eles terão mais de 50.
Na sua palestra você falou também sobre a menopausa, que algumas empresas estão começando a oferecer benefícios relacionados à menopausa. As mulheres jovens sofrem preconceito por causa da idade fértil, porque podem ter filhos. As mulheres mais velhas já não têm isso. Elas sofrem o mesmo preconceito dos homens por causa da idade? Como é a questão de gênero no etarismo?
As mulheres sofrem mais. Tem poucas mulheres hoje com mais de 45 anos, porque as mulheres não chegavam a esses cargos de liderança. E quem tem 50 e poucos é quem está chegando nos cargos de liderança. Tem muito mais preconceito. A mulher desiste muito mais no meio do caminho. Mas hoje isso está mudando.
E você vê uma mudança rápida acontecendo ou estamos em passos lentos?
Eu não acho que é rápido. São poucas empresas ainda. Mas acho que depende do quanto a gente fala sobre isso. Talvez muita gente nunca tenha nem ouvido falar o termo economia prateada e vai chegar no escritório e se interessar em olhar quantas pessoas acima dos 50 anos estão trabalhando lá. Eventos como esse (o RH Experience, onde ela fez uma palestra sobre o assunto, que pode ser vista aqui) fazem com que as empresas abram o olho e isso acelera. Depende de nós fazer a mudança.
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