ESG

“Metas ESG têm que estar na remuneração variável”, diz Alex Carreteiro, CEO da PepsiCo

Denize Bacoccina

É preciso ter metas e é preciso que o tema esteja na agenda da alta liderança a empresa. É essa a receita do CEO da PepsiCo Brazil Foods, Alex Carreteiro, para uma empresa que quer levar a sério suas ações ESG. Para que a empresa realmente se comprometa a cumprir as metas, ele defende que elas façam parte da remuneração variável da liderança.

“É um tema muito relevante e para mexer de uma maneira significativa tem que estar na minha agenda, do meu time direto, em toda a liderança da companhia”, afirmou nesta entrevista, realizada na mesma noite em que ele fez uma palestra sobre o tema na Confraria de CEOs. O evento foi realizado pelo Experience Club com a presença de um grupo de 130 líderes de grandes empresas, na Experience House.

Carreteiro compartilhou a estratégia e os resultados da companhia, que já vinha praticando ações de inclusão racial, de gênero e investindo em práticas mais sustentáveis e, em 2021, criou uma estratégia global, batizada de PepsiCo Positive. “Decidimos colocar ESG no coração da nossa estratégia”, disse ele.

Veja a palestra de Alex Carreteiro na Confraria de CEOs do Experience Club.

Leia a entrevista:

[EXP] – Alex, quais são as principais ações da PepsiCo no Brasil dentro da jornada ESG?

[Alex Carreteiro] – O tema está em nossa pauta há muitos anos, mas em 2021 decidimos colocar ESG no coração da nossa estratégia. Criamos a PepsiCo Positive, a nível global, que tem três grandes pilares. O primeiro pilar é o da agricultura positiva. O segundo é cadeia de valor positiva e o terceiro são as escolhas positivas. Cada um deles tem ações bem profundas na agenda ESG.

Nós somos uma empresa agrícola. Às vezes as pessoas não sabem, pensam na bebida Pepsi, mas aqui no Brasil nós compramos mais de 450 mil toneladas de matéria-prima agrícola, somos o maior comprador de batata do Brasil, o maior comprador de milho, um grande comprador de aveia. Temos duas fazendas próprias de coqueiros. Já somos 100% sustentáveis e em menos de três anos vamos ser 100% regenerativos.

São várias iniciativas: usamos drones para monitorar a evolução das batatas, temos parcerias de longa data com mais de 30 produtores agrícolas, uma batata eletrônica que monitora a qualidade do solo, um sistema de irrigação com menos água. Lay´s é uma marca que vai do campo ao pacote em 48 horas e usa apenas três ingredientes: batata, óleo e sal. A nossa origem do campo está em tudo que a gente faz em ESG, começando pela agricultura.

Esse volume de compras também dá a vocês a possibilidade de causar um impacto no mercado como um todo. Você nota já alguma influência, algum resultado dessas ações?

Sim, e um exemplo que trago é o do coco e do cacau. Nós temos nossas plantações e trabalhamos com fazendeiros da Bahia e de Pernambuco para plantar o cacau embaixo dos coqueiros, porque o cacau precisa de sombra e o coqueiro tem de 3 a 7 metros, o que traz melhor rentabilidade, é mais fértil para a terra. Temos quatro fazendas que são de demonstração de toda essa tecnologia, justamente para estimular o mercado. Temos 100 fazendeiros que trabalham com a gente diretamente, e vários também indiretamente para avançar nessas tecnologias de dados, de irrigação, para ajudar na agenda do Brasil como um todo.


E nessa linha regenerativa que você falou, quais são as ações?

Na agricultura regenerativa temos sistemas de irrigação que regulam o uso da água, contribuindo para a preservação do solo. Por exemplo, os fazendeiros de batata plantam por dois anos, depois eles migram, vão para o milho. Realizamos estudos para os ajudar. Temos patente de batatas para cada região do Brasil, em função do clima.


E vocês têm uma área científica para desenvolver essas variedades?

Sim, nós temos a nível mundial um centro para desenvolver as patentes das batatas em função do clima. A gente analisa, testa e a trabalha junto com o fazendeiro, com o governo, para desenvolver a agricultura brasileira. Não é uma coisa só nossa, dos nossos parceiros, mas beneficia a agricultura brasileira como um todo.

E vocês também são uma grande indústria, e a indústria já tem outros desafios. A questão da própria planta, a distribuição, a frota. Quais são os projetos ESG para essas outras áreas?

Esse é o segundo pilar, a cadeia de valor positiva. Temos oito fábricas no Brasil, 11 mil pessoas trabalhando e as nossas fábricas têm um trabalho muito forte de energia renovável, elas usam 100% de energia renovável e também têm o menor desperdício de água possível. Já reduzimos em 14% o consumo de água por quilo de produto produzido e a boa notícia é que nós implantamos em Itu, nossa maior fábrica, uma membrana biorreativa que filtra e reutiliza toda a água. Temos zero utilização da água da municipalidade.

Vamos replicar esse modelo para as fábricas de Sete Lagoas e de Curitiba. Somos os pioneiros em trazer essa tecnologia para o Brasil. Também assinamos um contrato com a Ultragaz para ter neutralidade de CO2 usando biometano na fábrica de Itu. Isso vai reduzir em 44% as nossas emissões de CO2 e é muito importante para a nossa pegada de carbono.

Também temos certificados de reciclagem de 100% das nossas embalagens. Trabalhamos com catadores, com várias cooperativas de reciclagem para diminuir a pegada de CO2. Nossa frota tem hoje 250 veículos elétricos, temos veículos com gás natural, usamos painéis solares em cima dos nossos caminhões e isso fornece energia para os equipamentos.

Como começou essa estratégia ESG? É uma coisa que veio da PepsiCo Mundial ou o Brasil tem autonomia para criar sua própria jornada?

É uma estratégia global. A PepsiCo é muito focada nessa transformação de toda a cadeia de valor em ESG. Eu diria que o Brasil, pela dimensão que tem, é um país relativamente avançado em energia renovável e agricultura. Aceleramos muito essa jornada. Sobre o terceiro pilar, que são escolhas positivas, a gente fala muito de diversidade, equidade e inclusão, essa é uma pauta muito brasileira. Nós temos uma população que é 56% negra e esse pilar, especificamente, está no coração do que a gente faz aqui no Brasil.

Vocês têm metas de diversidade de gênero, raça, idade, nas equipes?

Em toda agenda de ESG, nós temos metas, KPIs que nós seguimos, e isso também impacta na remuneração variável de toda a nossa liderança. Acho que esse é um tema muito relevante para você mexer de uma maneira significativa essa agenda: ela tem que estar na minha agenda, do meu time direto, e em toda a liderança da companhia.

E quem estabelece esses KPIs?

Nós temos KPIs específicos do Brasil e nós temos KPIs globais. Estamos trabalhando na agenda global para reduzir as emissões de CO2, avançar no perfil nutricional dos produtos. No Brasil, determinamos que queremos ter 50% de mulheres líderes e a boa notícia é que até 2025 nós vamos atingir essa meta, atualmente estamos em 49,5%. No meu time direto são 60% de mulheres. Avançamos 10 pontos percentuais nos últimos quatro anos. É um grande orgulho. Temos também grupo de afinidade de mulheres, de negros, de pessoas LGBTQIA+. Cerca de 400 pessoas participam nesses grupos de afinidade, estão envolvidos em tudo que a gente faz.

Temos o objetivo de chegar a 30% de líderes negros. A gente sabe que é um desafio. No Brasil, só 6% dos líderes são negros. Hoje já estamos em 27%, avançamos 10 pontos também nos últimos quatro anos. Somos uma das empresas que criou o MOVER, que é o Movimento pela Equidade Racial. Eu fiz parte, junto com sete CEOs. Criamos em 2021 e hoje somos 50 CEOs. O objetivo é impactar 3 milhões de pessoas negras com cursos de inglês, classes de mentoria de liderança, letramento racial, acesso a preparação de currículo, entrevistas. Essas empresas se comprometeram a recrutar 10 mil líderes negros.

Um dos desafios hoje das empresas é a diversidade de faixas etárias. Tem o etarismo e ao mesmo tempo tem a geração Z entrando no mercado. São cinco gerações trabalhando juntas. Como vocês fazem para não ter conflito, para aproveitar o lado bom dessa diversidade etária?

É um super desafio. E essa é a beleza também, porque nós acreditamos que ter várias gerações trabalhando juntas e ter diversidade, equidade e inclusão, torna a empresa mais eficiente. Dobramos o tamanho da nossa companhia nos últimos quatro anos, investimos R$ 1,2 bilhão em fábricas e inovação. E essa diversidade de pessoas ajuda a entender melhor o consumidor, a ser mais ágil, ter uma pluralidade de opiniões. Queremos ter marcas com propósito, como é o caso de Lay´s, no campo, Doritos com a comunidade LGBTQIA+ e com a comunidade negra, Eqlibri com o empoderamento feminino, Toddynho com a educação.

Esses grupos de afinidade estão envolvidos em tudo que a gente faz e o grande orgulho que eu tenho, como líder de uma empresa em que 90% dos nossos 11 mil colaboradores estão na linha de frente, trabalhando como promotores, vendedores, em fábricas, em logística, é que temos uma ascensão, uma mobilidade social muito grande. Pessoas que começaram como promotores hoje são gerentes de vendas. Pessoas que começaram no armazém são diretores de logística. Temos uma agenda intencional de desenvolver a carreira das pessoas. Em algumas áreas é mais difícil de ter diversidade, mas a gente tem conseguido. Por exemplo, no armazém, tínhamos 10% de mulheres, e esse número subiu em dois anos para 35%. Temos mulheres motoristas de caminhão pesado. A gente sempre diz, o lugar da mulher é onde ela quer.


Pensando no impacto que vocês têm no mercado, pela liderança em vários setores, já que fizeram essa jornada e caminharam bastante, o que você pode dizer para uma empresa que está querendo começar com essa agenda ESG e não sabe muito bem como?

É realmente uma agenda complexa. Eu acho que a primeira coisa é reconhecer que não é fácil. Na minha opinião, o grande ponto é que essa agenda de diversidade, equidade e inclusão, que antigamente era uma pauta só de recursos humanos, tem que estar na pauta do CEO, na pauta do time de liderança. Tem que estar também no bônus e no salário variável de todo o time de gestão. E depois tem que ter muita intencionalidade e consistência. Não pode ser uma coisa feita para comunicar, tem que ser real, genuína e intencional.  

O Brasil é uma potência de ESG. Temos uma possibilidade única, ainda mais agora com o G20, com o COP30, de mostrar o que a gente faz. Colocar isso na pauta central do time é essencial. Eu iria além: eu acho que as empresas que não o fizerem, essa é a nossa licença de operar no futuro, nos próximos 5 a 10 anos. Hoje, os consumidores, pelo mesmo preço, optam por empresas mais fortes em práticas de ESG.


Você já sente isso no Brasil?


Sentimos no Brasil. Os brasileiros ainda não pagam mais por isso, mas se tiver um preço comparável, elas preferem [comprar de empresas com práticas sustentáveis]. A gente vê por exemplo com Lay´s, quando a gente fala da agricultura regenerativa, coloca foto dos agricultores. Isso tem um impacto grande. Quando a gente faz uma campanha de Toddynho com os Amigos do Bem, que um valor é revertido para combater a fome no sertão cearense. Os consumidores sabem muito, estão muito informados.

E eles boicotam quem não faz isso?

Acho que não chegamos ainda no nível de boicotar, mas eles têm uma tendência a preferir cada vez mais e ser mais vocais para as empresas que estão fazendo e talvez em algum momento vão pagar um pouquinho mais, porque essas iniciativas acabam tendo um custo e um investimento, sobretudo para quem é pioneiro.

Você falou que a empresa dobrou de tamanho nos últimos anos. Você acredita que foi essa pauta que proporcionou isso?

Eu acho que é uma pauta que contribuiu muito. Fizemos várias mudanças nos nossos produtos, mostrando que eles são naturais e têm menos calorias. Mudamos o nosso azeite para um azeite à base de canola e girassol, com menos gordura saturada. Agora com a nova lei de etiquetas, 85% dos nossos produtos não têm selo de alta gordura saturada ou alto em sódio. Nos últimos dez anos nós reduzimos 60% o sódio dos nossos produtos. É um trabalho contínuo, ainda tem muito por ser feito em toda a agenda ESG. Mas eu acredito que sim, que estamos mostrando ao consumidor que a gente pode inovar.

Leia também:

Report Confraria de CEOs

  • Aumentar texto Aumentar
  • Diminuir texto Diminuir
  • Compartilhar Compartilhar